Os "Rs" da sustentabilidade

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Autoria: Henrique Rozenfeld (roz@usp.br)

Introdução

O termo “Rs da sustentabilidade” tem origem no uso dos verbos iniciados pela letra “R”, tais como reciclar, reutilizar, recondicionar etc.

Normalmente o prefixo “re” significa “realizar novamente a ação do verbo” (mas há exceções, como no caso de reparar). É uma questão histórica intitular as estratégias de “Rs” da sustentabilidade. Isso tornou a representação dessas estratégias em algo mais intuitivo.

Quantos “Rs” existem?

Não há um consenso e mesmo assim, sempre surgem novos agrupamentos das estratégias em quantidades variadas de “Rs”, como mostramos no tópico agrupamento dos “Rs”. Reike, Vermeulen & Witjes (2018) realizaram um levantamento de 69 “Rs” da sustentabilidade e sintetizaram em 10. Nesta seção compilamos em 16 “Rs”, apesar que alguns poderiam ser enquadrados dentro de outros.

Frameworks de estruturação dos “Rs”

Existem diversas propostas de categorização dos “Rs” em agrupamentos de 3 a 14 “Rs”. Normalmente a estrutura de alguns desses agrupamentos traz um significado que auxilia a seleção das estratégias mais adequadas.

Um exemplo de framework de estruturação dos “Rs” com o objetivo de apoiar a seleção de uma estratégia é o do Potting et al. (2017).

De certa forma, “ter” de iniciar a denominação de uma estratégia com um “R” traz uma limitação. 

Hoje existem frameworks de taxonomias de estratégias de sustentabilidade, que propõem categorias, cuja denominação não se inicia com um “R”, como cascatear (cascade) ou atualizar (upgrade). Porém, alguns autores sempre “dão um jeito” de enquadrar em uma estratégia, cujo título se inicia com um “R.

Conheça o Checklist de estratégias de economia circular – CIRCit Scanner que traz vários “Rs”, mas que apresenta uma estrutura de classificação (taxonomia) mais intuitiva de estratégias de economia circular para aplicação em empresas de manufatura, com algumas categorias / estratégias, cuja denominação não se inicia com um “R”.
Na seção sobre economia circular trazemos outros exemplos de frameworks de estratégias de economia circular.

 

Estratégias versus práticas

Como mostramos na seção sobre economia circular, as estratégias de economia circular podem ser implementadas e orientar a aplicação de mais de uma prática de economia circular. Normalmente, exemplos de estratégias são na verdade a descrição de uma prática.

Por exemplo, uma estratégia de reciclar é reaproveitar os resíduos de um produto como matéria prima, como no caso da empresa HP, que em 2021 utilizou 40% de conteúdo reciclado em peso de plástico na fabricação de novas impressoras

A diferenciação entre estratégias e práticas ainda não está bem definida. Porém, consideramos que não seja importante saber se é uma estratégia ou uma prática que você vai aplicar na sua empresa. Essa questão só é importante quando se estrutura “catálogos” de práticas de sustentabilidade a serem utilizados por pessoas interessadas em implementar essas práticas.

Os papéis do design e da mentalidade

Como apresentamos no tópico “O problema e a solução estão no design” da seção principal sobre economia circular, existem diversas práticas de DfX que contribuem para a implementação das estratégias de economia circular.

Consideramos neste contexto o design de novos modelos de negócio, tecnologia, sistemas, produtos e serviços.

Como comentamos naquele tópico, o fator essencial para a adoção das estratégias e práticas da sustentabilidade, e, consequentemente, aplicação dos DfXs, é a mentalidade das pessoas, que molda o comportamento e, geralmente, é influenciada pela cultura organizacional e pela sociedade, nas quais as pessoas estão inseridas.

Esta seção

Apresentamos a seguir uma compilação das definições de 16 Rs de sustentabilidade. Em seguida mostramos exemplos de agrupamentos desses “Rs” e destacamos alguns frameworks / categorias das estratégias.

O foco dessa apresentação está na perspectiva de uma empresa, mas em algumas estratégias apresentamos a perspectiva individual.

Compilação dos “Rs” da sustentabilidade 

 Os 16Rs desta compilação são: refletir, rejeitar (recusar), repensar, reduzir, reusar, redirecionar (repurpose), reparar (restaurar), recondicionar, remanufaturar,  reciclar, reintegrar, respeitar, responsabilizar-se, repassar, recuperar e reminerar.

Pode ser que seja difícil diferenciar algumas estratégias de outras, pois há certas ambiguidades que vamos destacar ao apresentar as estratégias. Além disso, alguns exemplos práticos podem ser enquadrados em mais de um tipo de estratégia. O importante é pensar no conjunto das estratégias, que direcionam as posturas pessoais ou práticas que devemos adotar para atingir os objetivos da economia circular.

 

  • as principais características de uma estratégia são colocadas em itens, como este
  • os exemplos estão em itálico e nesta cor, com hyperlinks  (quando for o caso) para consultar as fontes dos exemplos

Refletir

  • é uma atitude individual, que pode ter consequências empresariais, de se considerar que cada ato de consumo tem um impacto ambiental e, assim, a reflexão sobre esses atos pode contribuir para a diminuir os impactos negativos;
  • essa atitude pode levar às estratégias da categoria “recusar” ou ser considerada equivalente à categoria “repensar”, apesar que o foco de repensar está na criação de novos modelos de negócio.

Por exemplo, não devemos pensar somente no meio ambiente. Precisamos cuidar de nós mesmos, do próximo, sermos altruístas e realizar pequenos atos. É imprescindível realizar aquela reunião presencialmente? Essa viagem de avião pode ser evitada? Considere constantemente as diferentes perspectivas da sustentabilidade.

Rejeitar, recusar (refuse)

  • deixar de usar algo não necessário ou que ainda tenha um substituto em condições de utilização;
  • tornar alguns produtos redundantes e por isso sem necessidade de utilização (rejeitar o seu uso);
  • oferecer a mesma funcionalidade com um produto diferente de menor impacto (rejeitar usar o produto com maior impacto);
  • deixar de comprar produtos (rejeitar consumir) de empresas que prejudicam o meio ambiente, que utilizam mão de obra infantil ou em condições degradantes (ou de empresas, cujos fornecedores praticam essas ações).

Às vezes, o recusar está relacionado com o repensar, quando adotamos novos modelos de negócio que não exigem o uso de muitos produtos, ou seja, um novo modelo de negócio (do repensar) faz com que possamos recusar utilizar o antigo, que seja menos sustentável (que cause um maior impacto ambiental e/ou social e/ou econômico).

Frequentemente, recusar é algo de foro íntimo, quando não estamos alinhados com práticas não sustentáveis de empresas e, assim, recusamos os seus produtos. Pode também estar relacionado com avanços tecnológicos disruptivos, que fazem com que os produtos, que estávamos acostumados a consumir / comprar, apresentem um maior impacto negativo em comparação com as inovações.

 Exemplos:

  • a utilização de um smartphone substitui vários produtos com diversas funcionalidades (GPS, máquina fotográfica, telefone, chat, e-mail, videoconferência, mapas, relógio, cronômetro, calculadora, jogas, vídeo game etc.), pois ele é um produto multifuncional e depende de fornecedores de soluções complementares (do ecossistema );
  • música e vídeo em streaming eliminam a necessidade de se possuir CDs ou DVDs (este caso pode ser considerada uma nova forma de se entregar essas funções, sendo, portanto, a estratégia de repensar);
  • a leitura por meio de dispositivos eletrônicos (como o Kindle da Amazon) ou jornais na web elimina a necessidade de se utilizar papel e tinta para imprimir livros / jornais;
Repare nos três exemplos anteriores, que nesses casos, o recusar implica em uma mudança de paradigma (utilização de smartphones, novas formas de ouvir música ou de ler um livro). Essas mudanças estão associadas à aplicação de tecnologias disruptivas (smartphone, streaming e e-books). O determinante aqui é o surgimento de uma tecnologia disruptiva, que “desbanca” as aplicações baseadas em tecnologias antigas, que implicam em mudança no modelo de negócio. Assim, também é possível enquadrar (classificar) essas estratégias no “repensar” (próxima categoria de estratégias).
  • evitar comprar chocolate de empresas, cujos fornecedores utilizam mão de obra infantil em condições degradantes ou similares à escravidão;
  • a utilização de nossos próprios copos ou canecas em eventos, trabalho, academia etc., evitam o uso de material descartável;
  • comprar produtos, cujas embalagens sejam recicláveis, retornáveis ou mesmo sem embalagens, como no caso de compra de cereais a granel.

 

Repensar (rethink)

  • desenvolver novas formas de entregar uma função e/ou proposta de valor por meio de inovações de modelo de negócios, como modelos baseados em uso e desempenho, ou sistemas produto-serviço, nos quais a posse do produto não é transferida para o usuário / cliente (como um dos exemplos de inovação em modelo de negócio);
  • estender a vida dos produtos oferecendo serviços de apoio, como manutenção, durante toda a vida dos produtos;
  • estender a vida dos produtos aproveitando dos valores residuais dos produtos e possíveis co-produtos, que resultam do processo produtivo;
  • da perspectiva individual: praticar o consumo consciente, mudando práticas atuais que causam impactos ambientais e sociais; 

Esta estratégia pode estar relacionada com as estratégias de respeitar e responsabilizar-se, e pode ser consequência da estratégia de refletir.

Exemplos:

  • o compartilhamento de automóveis e bicicletas é uma nova forma de se pensar na posse e no consumo, não necessitamos mais ter a posse desses produtos, assim esses produtos não ficarão tanto tempo  ociosos (leia mais sobre economia compartilhada);
Neste vídeo você pode conhecer o outro lado do compartilhamento do compartilhamento de automóveis, que na China resultou em grandes impactos ambientais, pois a oferta foi muito maior do que a demanda e as empresas que ofertavam esses serviços quebraram.
  • o modelo de negócio do sistema produto-serviço (PSS) também é uma nova forma de se pensar como oferecer uma funcionalidade sem a necessidade do cliente possuir o produto;
  • Os sistemas produto-serviço (PSS) orientados a resultados são exemplos dessa estratégia, como o caso do pay-per-lux da Philips, no qual a empresa cliente contrata luminosidade por m2;
  • estender a vida dos produtos por meio de uma assinatura dos serviços de manutenção, que pode estar associada ao monitoramento do uso e do desempenho do produto para o acionamento de manutenções preditivas, como no caso do serviço de gestão do ciclo de vida que a Siemens oferece para o setor de bens de capital intensivo;
  • não adotar mais a obsolescência programada, e sim modelos de negócio, como os citados anteriormente. Na perspectiva pessoal, você deve procurar empresas que não praticam a obsolescência programada;
  • editoras de revistas podem oferecer publicações mais antigas, que ainda possuem conteúdos atuais, a menores preços, para evitar o descarte de material impresso não vendido;
  • a leitura por meio de dispositivos eletrônicos (como o Kindle da Amazon) ou jornais na web elimina a necessidade de se utilizar papel e tinta para imprimir livros / jornais;
  • a produção de co-produtos, a partir das matérias primas (veja o exemplo a seguir da British Sugar).

As fábricas da British Sugar operam um modelo de fabricação avançado que evita o desperdício, transformando as saídas do processo em insumos para uma ampla gama de co-produtos. Esses co-produtos incluem (entre outros):

  • agregados, que vem com a colheita da beterraba (de onde eles extraem o açúcar), como pedras, que eles tratam e comercializam para empresas de construção de estradas e obras;
  • 200 mil toneladas de solo,que vêm com a colheita de 8 milhões de toneladas de beterraba, são processados como topsoil e vendidos para empresas de paisagismo; 
  • ração animal.

Os processos da British Sugar resultam em menos de 200 gramas de resíduos para cada tonelada de açúcar produzida – praticamente zero desperdício.

Reduzir (reduce)

  • aumentar a eficiência dos produtos e dos processos de produção e operação para que sejam consumidos menos recursos naturais e materiais em todas as fases do ciclo de vida (BOL, MOL, EOL);
  • ou seja, na extração ou aquisição de matéria prima, na manufatura, na logística, no uso e/ou operação dos produtos, na oferta de serviços e no consumo de energia/
  •  da perspectiva individual: consumir menos baseado no repensar, respeitar e responsabilizar-se.

Exemplos:

  • a MRV conseguiu diminuir drasticamente os resíduos das obras civis com a aplicação da lean construction;
  • a abordagem denominada “Rewire” da Nike para a sustentabilidade da cadeia de suprimentos envolveu várias mudanças na empresa: transição para uma estrutura organizacional mais integrada, treinamento em lean manufacturing para desenvolver as habilidades dos trabalhadores e melhorar a eficiência, desenvolvimento de um novo esquema de incentivo aos fornecedores e promoção da inovação para envolver todas as partes interessadas relevantes na criação do ambiente necessário para que a mudança sistêmica ocorresse (Porteous & Rammohan, 2013);
  • a simbiose industrial, que também pode ser classificada como uma estratégia de reuso e faz parte da ecologia industrial, cria sinergia entre empresas para que os resíduos de algumas empresas possam ser utilizados como matéria-prima de outras; 
  • estender a vida de produtos por meio da aplicação de técnicas para aumento da robustez dos produtos (como os testes de confiabilidade) reduzem a necessidade de se adquirir novos produtos;
  • a Finlayson é uma fabricante de roupas, toalhas, lençóis e outros produtos baseados em tecidos. Essa empresa pode ser um exemplo das três áreas relacionadas com restaurar, reduzir e evitar. Visite o blog da empresa para conhecer as iniciativas de sustentabilidade. A empresa trabalho com materiais reciclados, possui condições de trabalho apropriadas para os seus colaboradores, utiliza materiais virgens certificados e sustentáveis, os materiais são duráveis com tempo longo de uso, publica melhores práticas de como tratar e conservar os materiais para que eles tenham uma maior durabilidade, garantem a durabilidade do material por pelo menos cinco anos com as mesmas características que um original e pagam um salário adequado para seus colaboradores.

Reusar ou reutilizar (reuse)

  • estende a vida de um produto existente para uma nova fase de utilização com as mesmas funcionalidades;
  • pode envolver a limpeza e uma nova embalagem, mas, em geral, não envolve a desmontagem ou a emissão de garantia (há exceções, como em equipamentos que precisam ser certificados);
  • as funcionalidades originais de um produto (descartado ou fora de uso), que ainda está em boas condições, podem atender a  novos clientes ou usuários em um contexto de uso diferente;
  • muitas vezes um produto usado é passado para um outro usuário sem o envolvimento do fabricante (veja os exemplos das plataformas online de venda de produtos usados);
  • essa estratégia permite a redistribuição de produtos usados, o que estende a vida do produto, e, assim, evita que alguns novos produtos sejam produzidos, com toda a consequência resultante de uma nova produção (extração de material, gasto de energia, resíduos da produção, tempo e recursos investidos para remanufaturar etc.)
Se não for para a mesma funcionalidade, a estratégia é a de “redirecionar (repurpose”), apresentada mais adiante.

Exemplos:

  • venda de produtos usados em plataformas como ebay ou OLX, para permitir que esses produtos possam ser utilizados por outros usuários (atualmente essas plataformas também vendem novos produtos);
  • algumas plataformas são especializados em alguns tipos de equipamentos, que são certificados para garantir a sua funcionalidade, como a mills ou armac;
  • brechós de venda de roupas descartadas por outros usuários; hoje existem diversos brechós online, tais como, repassa, enjoei, etiqueta única etc;
  • 90% dos resíduos industriais das unidades da Flex do Brasil são transformados novamente em matéria-prima e reinseridos na cadeia produtiva.

Redirecionar (repurpose)

  • encontrar uma nova aplicação (novo objetivo / nova funcionalidade) para um produto e/ou seus componentes descartados ou fora de uso, que ainda estão em boas condições (comparar com o reusar, que visa usar novamente o produto para a mesma aplicação);
  • pode ser que apenas uma parte dos produtos ou componentes sejam utilizados na nova aplicação;
  • os componentes que não forem utilizados podem ser submetidos a uma outra estratégia de recircular;
  • pode ocorrer que novas funcionalidades e, portanto, componentes sejam adicionados à nova fase de uso para a nova aplicação.
Você poderá encontrar o termo “repropor” como tradução “literal” de “repurpose’. Isso é um anglicismo, que aos poucos podemos aceitar. Repropor em português significa “fazer uma nova proposta” e em inglês significa “encontrar uma nova aplicação para uma ideia, produto ou construção”. 

Exemplos:

Alguns autores consideram o redirecionar como reutilizar, pois um produto descartado é “reutilizado” em uma nova aplicação.

Reparar ou restaurar (repair ou restore)

  • tanto a manutenção corretiva quanto a preditiva pode ocorrer baseada em uma condição (por exemplo, desgaste de algum componente que leva ao mal funcionamento)
Essa condição pode ser mensurada por sensores, com base na tecnologia de IoT (internet of things), que estão embutidos nos produtos.
  • pode ocorrer a substituição de componentes gastos para retornar à funcionalidade original e, assim, evitar a substituição do produto;
  • estende a fase atual de utilização do produto corrigindo os componentes defeituosos;
  • pode envolver a desmontagem parcial do produto;
  • pode ser emitida uma garantia limitada depois da reparação (conserto) do produto;
  • devolve o produto a sua condição original (ou melhor);
  • a manutenção pode ser realizada pelo próprio cliente, fornecedor original ou terceiros;
  • a manutenção de produtos mais complexos (como aviões, turbinas ou usinas atômicas) é realizada por empresas especializadas e deve seguir normas bem restritas de segurança;
  • pode ser necessário utilizar ferramentas ou procedimentos especiais;
  • a manutenção pode resultar em receitas extras para o fabricante.

Exemplos:

  • aumentar o desempenho de equipamentos eletrônicos, como a troca de HD por SSD em notebooks; 
  • aumentar a capacidade de armazenamento de equipamentos eletrônicos;

Observe neste exemplo, que poderíamos confundir com a estratégia “recusar”, pois uma nova tecnologia (SSD) está substituindo uma antiga (HD). Mas na estratégia de “recusar” é o produto como um todo e aqui é um componente, que aumenta o desempenho. Mas será que este aumento está associado com um menor impacto ambiental?

No link colocado acima há uma comparação entre ambos. SSD é mais rápido, dura mais, porém é mais caro e, por isso, quando adquirimos pelo mesmo valor, a capacidade de armazenamento é menor. Não há uma menção sobre impacto ambiental.

Tannu  & Nair (2022) mostraram em um estudo que compara o impacto ambiental do SSD, que ele consome menos energia, mas o seu processo de manufatura resulta em uma maior emissão de CO2, em comparação com o HD. Porém, ao longo do tempo, a menor necessidade de energia compensa a maior emissão e, no fim de vida, os componentes do SSD são mais fáceis de serem reciclados. Acesse o estudo para conhecer suas limitações.

  • atualizar a estética de um sofá ao trocar o estofado e seu desempenho ao trocar a espuma;
  • o desgaste de um componente de uma máquina pode causar maiores forças e torques, que quando modelados (anteriormente por modelos matemáticos) e monitorados (durante a operação) podem indicar que é o momento para realização de uma manutenção preditiva;
  • na área de aeronáutica, a manutenção é essencial para manter as aeronaves seguras e é realizada por empresas de MRO (maintenance, repair and overhaul), ou seja, de manutenção, reparo e revisão geral.

MRO pode significar maintenance, repair and overhaul (vamos chamar de MRO1) e maintenance, repair and operation (vamos chamar de MRO2). A diferença está no significado da letra “O” (revisão geral ou operação): 

  • O MRO1 normalmente é utilizado para descrever os processos de um local (empresa) que realiza a manutenção, reparo ou revisão geral em bens de capital intensivo, como aviões, navios, trens e outros.  
  • O MRO2 conota um processo empresarial para manutenção, reparo e operação de todas as instalações industriais (Incluindo os equipamentos) para manter uma empresa em funcionamento. Pode ser encontrado neste significado o uso do termo MRO associado à gestão de estoque de itens relacionados a esses três processos (manutenção, reparo e operação).

Leia mais na wikipedia em inglês. O título deste verbete traz somente o termo “maintenance” (manutenção), mas o seu conteúdo trata de MRO1 e 2.
A dissertação de Luis Gabriel Rossi Roque sistematiza um processo de gestão de portfólio de projetos de MRO1, aplicados em uma empresa real.

As próximas duas estratégias visam aproveitar o valor residual dos produtos. Essas estratégias podem ser consideradas uma forma de se repensar a forma tradicional e linear de se consumir e descartar produtos, ou seja, é uma maneira de se reconfigurar o modelo de negócio, incluindo o ciclo reverso de manufatura (que inclui a logística reversa).

Recondicionar (refurbish)

  • estende a vida do produto para uma nova fase de uso, com qualidade inferior à original, a partir de um produto ou componente descartado ou fora de uso pelo proprietário atual;
  • inicia com o retorno no produto (normalmente com a logística reversa);
  • o produto e seus componentes são restaurados para condições funcionais semelhantes (mas não iguais) às de um novo produto;
  • normalmente as condições do produto / componente após o recondicionamento é inferior às condições de um novo produto (as mesmas condições são obtidas por meio da remanufatura);
  • o cliente de um recondicionamento precisa estar ciente de que as condições de um produto recondicionado são limitadas, quando comparadas com um produto original; 
  • as atividades de recondicionamento podem envolver: desmontar, limpar, reparar, remodelar, pintar novamente, resleeving ou cladding, e montar novamente;

As traduções em português para sleeving e cladding poderiam ser “recobrir”. Na verdade, é um recobrimento seguido de tratamento da nova superfície. No caso de componentes mecânicos seria um processo de usinagem.

  • Sleeving para recobrimento das superfícies de furos (como a de um cilindro de um bloco de motor) e no caso de superfícies externas (como a de um pistão de motor) é denominada de encamisamento. Sleeve (cuja tradução literal é manga, não a fruta e sim a peça normalmente cilíndrica de uma roupa ou vasilhame) também indica um processo de rotulagem de garrafas plásticas, que se ajustam a superfícies não cilíndricas.
  • Cladding, denominado também de cladeamento,  consiste em depositar uma camada de material por fusão ou sinterização a laser do novo material. Depois, a nova camada pode sofrer igualmente um tratamento. Conforme o material da nova camada revestida, a qualidade do componente pode ser melhor do que o original (por exemplo, quando um cilindro hidráulico cromado sofrer o processo de cladding com um material sinterizado mais resistente – veja o exemplo da empresa HRC no tópico sobre remanufatura). 
  • o recondicionamento pode ser realizado pelo próprio cliente, fornecedor original ou terceiros;
  • o período de garantia oferecido normalmente é reduzido e o produto é vendido a um preço menor, em comparação com produtos novos;
  • também são considerados produtos recondicionados, aqueles que foram devolvidos pelos compradores após um período de teste ou devido a algum problema, que foi resolvido pelo fabricante;
  • um produto recondicionado pode ser usado como um equipamento periférico de instalações ou para se estender a vida de produtos que não são mais produzidos;
  • equipamentos eletrônicos, como celulares, também podem ser recondicionados, quando eles forem colocados novamente em operação (diferente de reusar um produto existente sem sofrer recondicionamento);

Exemplos:

Remanufaturar (remanufacture)

  • estende a vida do produto para uma nova fase de uso, com a mesma qualidade do produto original, a partir de um produto ou componente descartado ou fora de uso pelo proprietário atual;
  • inicia com o retorno no produto (normalmente com a logística reversa);
  • os produtos são desmontados e limpos, e todas os componentes que não sofrem desgaste são reaproveitados;
  • os componentes que sofreram desgaste são substituídos ou processados para voltar à sua condição original;
  • os produtos remanufaturados voltam a apresentar as especificações, desempenho e qualidade de um produto original;
  • pode ocorrer que os componentes substituídos possam possuir uma melhor qualidade do que os originais, quando o fabricante original (OEM – original equipment manufacturer) aprendeu com as falhas e melhorou os componentes utilizados nas novas versões do produto e estiver remanufaturando produtos de versões anteriores;
  • as atividades de recondicionamento podem envolver: desmontar, limpar, reparar, remodelar, pintar novamente, resleeving ou cladding, e montar novamente;
  • a remanufatura de produtos especiais, customizados para a aplicação do cliente, permite que um produto com problemas possa reposto mais rapidamente do que na aquisição de um novo produto, pois o processo de remanufatura é mais rápido;
  • na próxima fase de uso, os produtos recebem a garantia de um novo produto.

Veja essa matéria sobre a diferença entre recondicionar e remanufaturar. Apesar dessa diferenciação, é comum  encontrar, na prática, empresas que remanufaturam os produtos denominando esse processo de recondicionar. Além disso, mesmo que o produto possua a mesma condição de um produto novo, em alguns mercados, o simples fato de um produto ser remanufaturado implica em praticar preços menores do que os produtos originais (o que não é um grande problema, pois dependendo do produto, grande parte do material é reutilizado, o que diminui os custos).

Na publicação de Potting et al. (2017), muito citada (924 citações em junho de 2023), há uma diferenciação entre recondicionar e remanufaturar, na qual não concordamos com a definição de remanufaturar. Segundo os autores:

  • recondicionar – restaurar um produto descartado em um novo produto com a mesma função.
  • remanufaturar – utilizar os componentes de um produto descartado em um novo produto com a mesma função.

Exemplos de produtos remanufaturados:

Conheça a plataforma da web que reúne informações sobre a remanufatura, que contém um guia para se definir um modelo de negócio para remanufatura.
Conheça a ANRAP – Associação Nacional dos Remanufaturadores de Autopeças.
Veja essa notícia sobre a unificação de definições das associações de remanufaturadores.

Reciclar (recycle)

  • estender a vida do material do produto, após a fase de utilização, ao processá-lo com o objetivo de obter o material original com propriedades iguais ou semelhantes;
  • a reciclagem ocorre quando o material é reprocessado na forma de materiais ou substâncias que foram extraídas por processos químicos ou metalurgicos e são novamente utilizados na aplicação original ou em outras;
  • a infraestrutura para reciclar materiais semelhantes ou advindos de produtos semelhantes pode ser compartilhada por vários atores com o objetivo de diminuir os custos de reciclagem (como no exemplo apresentado a seguir das instalações no Japão que atende as todas as empresas que produzem equipamentos da linha branca);
  • as atividades de reciclagem podem ser: coletar e armazenar os produtos descartados; transportar para os locais de processamento; extrair e reutilizar os componentes que forem possíveis; separar os componentes a serem reciclados dos materiais perigosos; picotar todo o material a ser reciclado; classificar e separar os materiais semelhantes (dependendo da natureza dos materiais misturados, a separação pode ocorrer por meio da densidade, por atração magnética ou eletricidade ou alguma característica mecânica);
  • extrair e reutilizar materiais de maior valor agregado, cuja aplicação seja viável economicamente;
  • enviar os resíduos finais para a recuperação de energia / compostagem ou para descarte;
  • a variedade e ligação dos materiais utilizados em um produto exige a aplicação de tecnologias avançadas para a separação, ainda mais de os mesmos materiais estiverem dispersos no produto em pouca quantidade’;
  • materiais críticos e estratégicos podem estar disponíveis no produto em uma maior quantidade e concentração do que nos seus depósitos naturais justificando a sua reciclagem;
  • quando a quantidade e concentração dos materiais forem baixas, pode ser impraticável reciclar do ponto de vista econômico, por isso a eficiência da reciclagem precisa ser avaliada, o que é um desafio para muitos casos, nos quais não existe informação disponível.

Um relatório da União Europeia sobre indicadores de matérias primas de 2020 apresenta seções específicas sobre economia circular e reciclagem e extraímos as seguintes conclusões, que consideramos relevantes:

  • a circularidade da economia permanece baixa e ela teria benefícios de uma melhoria da eficiência dos recursos e aumento da aplicação das estratégias de reutilização, remanufatura e reciclagem
  • a reciclagem de lixo eletrônico é eficiente para obtenção de materiais secundários, mas não para materiais críticos

Recomendamos que as pessoas interessadas nesse assunto leiam as demais conclusões e monitorem a publicação de novos relatórios, que são atualizados constantemente.

Exemplos:

  • a empresa Camiseta feita de PET produz vários produtos, tais como, camisetas promocionais, ecobags personalizadas, brindes, a partir de garrafas PETs recicladas;
  • a Insecta utiliza materiais como plástico reciclado, algodão reciclado, borracha reaproveitada, peças de roupas usadas, tecidos de reuso e resíduos de produção que seriam jogados fora e os transforma em novos sapatos, acessórios e roupas;
  • A Comas produz peças por meio da técnica de “upcycling”, processo pelo qual produtos descartados são recuperados, transformados e recolocados no mercado;
  • a Green Eletron recicla material de equipamentos eletroeletrônicos e pilhas, que possuem muito valor (neste link você pode ler sobre a importância do lixo eletrônico);
  • pisos de borracha feitos de pneus reciclados;
  • a MInas Jr. consultoria mineral apresenta neste post os tipos de minerais existentes nos dispositivos eletrônicos; 
  • um estudo da câmara dos deputados federais do Brasil sobre minerais estratégicos e terras-raras mostra a situação do Brasil com relação ao resto do mundo e destaca a importância de reciclar e cascatear para obtenção do gálio, tântalo e terras raras, que são materiais essenciais para diversas tecnologias, como na produção de semicondutores, painéis solares e LEDs;
  • este relatório da União Europeia sobre matérias primas críticas (critical raw material) de 2020 mostra a demanda e aplicação desses materiais em tecnologias estratégicas, assim como diversas recomendações de reciclagem de materiais críticos para cada tipo de aplicação (células de combustível, baterias, turbinas eólicas, motores elétricos, células fotovoltaicas, robôs, drones manufatura aditiva e tecnologias digitais);
  • O Japão desenvolveu fábricas para reciclagem de produtos da linha branca e TVs, que depois da desmontagem e seleção manual, todo o material é picotado e separado automaticamente;
  • a reciclagem de vidro, de alumínio (o Brasil recicla 98,7 % das latas de alumínio) e de papel são muito difundidas;
  • em 2021 a HP utilizou 40% de conteúdo reciclado em peso de plástico na fabricação de novas impressoras.

A reciclagem de plástico pode ser enquadrada em mais de uma categoria:

  • quando o plástico for picotado em pequenos grânulos (reciclagem mecânica) com propriedades iguais ou semelhantes, os grânulos podem ser utilizados em vários produtos, tais como peças de automóveis, pisos, mangueiras, peças de produtos eletrônicos etc.
  • quando o plástico estiver contaminado com outros materiais, a qualidade dos grânulos é menor e eles podem ser usado na produção de produtos com qualidade inferior, como sacos de lixo;
  • quando o plástico for picotado e reprocessado para produzir produtos plásticos de menor qualidade, tais como, cadeiras, tapetes, mantas para pisos, embalagens não alimentícias etc. Podemos enquadrar esse processo na estratégia de cascatear (cascade). Mas não há um consenso sobre essa classificação, o que não é um fator relevante;
  • a reciclagem (recuperação) química do plástico, o transforma em materiais petroquímicos básicos, que podem ser utilizados na produção de matéria-prima, como a gasolina de plástico
  • a reciclagem (recuperação) energética do plástico pela incineração ou pirólise trata o plástico como combustível, pois ele possui uma capacidade calorífica. Assim, o plástico é transformado em energia térmica e elétrica. 

Os dois últimos processos se enquadram na estratégia de recuperar (recover).

Reintegrar (rot)

  • é devolver à natureza o que veio dela, principalmente os materiais orgânicos, pela prática, por exemplo, da compostagem. Reintegrar pode ser considerada um tipo de recuperação (outra estratégia, descrita mais adiante)

Por exemplo, a compostagem de resíduos orgânicos pode ser utilizada para a produção de fertilizantes.

Muitos autores tratam esta estratégia como parte do recuperar.

Respeitar

  • ter respeito pelos seres vivos, incluindo a natureza (que é viva!) no seu foro íntimo, que é a base do “responsabilizar-se” (próximo R).

Responsabilizar-se

  • é tomar atitudes pessoais que visem a sustentabilidade, começando pelos círculos mais próximos, como família, vizinhos, colegas de trabalho, até ações mais amplas na cidade ou mesmo país e por que não, no mundo;
  • participar de ONGs ambientais de forma voluntária.

Exemplos:

  • O GreenPeace foi uma das pioneiras quando falamos de ONGs ambientais. Ela foi criada em 1971, em uma região perto do Alasca por um pequeno grupo de cidadãos preocupados com os testes de armas nucleares dos Estados Unidos na época;
  • A World Wide Fund (WWF) foi criada em 1961 na Suécia e começou como um fundo de ajuda à vida selvagem, que rapidamente chegou em diversos países, como os Estados Unidos e Inglaterra, onde os primeiros projetos foram aprovados;
  • A Conservation Internacional foi criada em 1987 nos Estados Unidos. No início, a proposta era a de proteger biomas, mas posteriormente mudaram a missão para um enfoque maior na conexão entre os seres humanos e ecossistemas naturais focando prioritariamente no desenvolvimento de soluções através da pesquisa científica, parcerias com empresas, povos indígenas, entre outros
  • Greta Thunberg;
  • Paloma Costa;
  • Artemisa Xakriabá;
  • Autumn Peltier;
  • Chiara Sacchi;
  • Ridhima Pandey;
  • Ayakha Melithafa.
Na seção da flexM4i sobre coletâneas de casos de outras instituições, você pode acessar outras instituições que apresentam casos de economia circular / sustentabilidade, tais como, A fundação Ellen MacArthur,  The Circulator, Project Drawdown e Circle Economy.
Acesse neste link uma lista de ONGs ambientais. 

Repassar (rally)

  • é divulgar os conhecimentos sobre as ameaças existentes sobre o meio ambiente e divulgar as iniciativas, estratégias e práticas de sustentabilidade para que mais pessoas se engajem para melhorar o planeta e a sociedade. Inicie por encorajar os seus vizinhos, amigos e família a serem mais sustentáveis disseminando as informações sobre consumo consciente.

Recuperar (recover)

  • inclui recuperar energia ou nutrientes pelo processamento ou compostagem de materiais;
  • essa estratégia só deveria ser aplicada após vários ciclos de reciclagem dos materiais;
  • pode envolver os processos de incineração, pirólise e digestão anaeróbica

Diferença entre incineração e pirólise

  • “A incineração de resíduos é um processo que consiste na destruição térmica por oxidação (com presença do oxigênio), em temperaturas que vão de 900° e pode chegar a 1250°C. O tempo de residência em que o material será incinerado, é controlado. O controle é para permitir a quebra orgânica do resíduo, de modo a reduzir o volume e diminuir o risco de toxicidade do material” (RCR Ambiental). Leia mais na Wikipédia.
  • A pirólise dos resíduos é um  processo de decomposição ou alteração da composição de um composto (ruptura da estrutura molecular original), que ocorre pela ação de altas temperaturas (menores que as temperaturas da incineração) em um ambiente com pouco ou nenhum oxigênio. Leia mais no eCycle os tipos de pirólise: lenta, rápida, térmica e catalítica.
  • a recuperação de energia vale a pena, obviamente, quando os custos envolvidos na logística para transportar os resíduos, tratar os gases resultantes do processo, tratar o resíduos sólidos que sobram depois na queima e na geração de energia para a recuperação, sejam significativamente menores do que o calor recuperado;
  • o principal problema dessa estratégia são os gases tóxicos que podem surgir durante a recuperação de um material, por meio da queima (por exemplo).
  • “a digestão anaeróbia, ou também biogasificação ou biometanização, é um conjunto de processos em que os microorganismos degradam a matéria orgânica biodegradável na ausência de gás oxigênio… ela é amplamente usada como uma fonte de energia renovável. O processo produz biogás, uma mistura que consiste em metano, dióxido de carbono e traços de outros gases ‘contaminantes’. Essa mistura pode ser usada diretamente como combustível no aquecimento de água, preparo de comida, e até para tocar motores, mas que tem sua eficiência melhorada se reformado para atingir o nível de qualidade de biometano. O efluente sólido e líquido resultante do processo é rico em nutrientes e pode ser usado na agricultura, desde livre de patógenos, metais pesados e outros” (Wikipédia).
Conheça as matérias primas que podem ser utilizadas para a produção de biogás.
  • a prática de minerar aterros sanitários (landfill mining) extrai materiais com valor dos desses aterros e pode ser considerada uma estratégia de recuperar valor do que já foi descartado. Em países que aplicam diversas estratégias de economia circular, os aterros sanitários não possuem tanto material de valor, quando comparados a países, como o Brasil, onde ainda muito material de valor é descartado. Nos países que já recirculam muito material, o lixo dos aterros é utilizado prioritariamente para geração de energia (estratégia de recuperar energia apresentada mais adiante). Em países como o Brasil a estratégia de reminerar pode ainda extrair materiais de valor dos aterros sanitários.
  • “compostagem é o conjunto de técnicas aplicadas para estimular a decomposição de materiais orgânicos por organismos heterótrofos aeróbios, com a finalidade de obter no menor tempo possível, um material estável, rico em substâncias húmicas e nutrientes minerais formando assim um solo humífero” (Wikipédia) – leia mais).

Compostagem

Quando a recuperação deve ser utilizada?

  • os processos de reciclagem ou cascateamento não são estabelecidos para o tipo de material;
  • o material é perigoso e precisa ser eliminado (como resíduos hospitalares);
  • não há demanda por materiais secundários resultantes da reciclagem ou cascateamento, 
Em muitas listas de ‘Rs” da sustentabilidade, não existe a estratégia reintegrar (rot), já apresentada, que abrange a compostagem. Nessas listas, o recuperar engloba a compostagem. Assim, essa estratégia pode ser considerada uma estratégia de reintegrar ou recuperar. 

Exemplos:

  • a incineração do bagaço da cana de açúcar ou do lixo pode aquecer a água, que se transforma em vapor em uma termoelétrica para produção de energia elétrica;
  • compostagem resulta na decomposição de matéria orgânica para produzir nutrientes minerais a serem aplicados em solos (considerada nesta lista uma estratégia de reintegrar)
  • as cinzas da queima do bagaço de cana pode ser usada na construção civil;
  • um biodigestor pode decompor material orgânico, que se transforma em gás metano, que pode ser queimado em um motor de combustão acoplado em um gerador de energia elétrica;
  • a recuperação química do plástico, o transforma em materiais petroquímicos básicos, que podem ser utilizados na produção de matéria-prima, como a gasolina de plástico;
  • a recuperação energética do plástico pela incineração ou pirólise trata o plástico como combustível, pois ele possui uma capacidade calorífica. Assim, o plástico é transformado em energia térmica e elétrica.

Reminerar (re-mine)

Os tópicos desta estratégia foram retirados de Reike, Vermeulen & Witjes (2018):

  • o reminerar é uma estratégia de economia circular esquecida ou ignorada;
  • é composto pelo recuperar materiais que estão enterrados em aterros sanitários;
  • é a extração de materiais de valor por setores muitas vezes informais, que trabalham muitas vezes em condições degradantes;
  • é comum de ser encontrado em países, nos quais pessoas extraem esses materiais e vendem para manterem a sua subsistência;
  • muitas vezes, essas pessoas estão expostas a substâncias que afetam negativamente a saúde
Alguns autores denominam esta estratégia como recuperação seletiva de componentes, ou seja, pertence a estratégia anterior de “recuperar”. 

E os efeitos rebote?

Os “efeitos rebote” na sustentabilidade referem-se a situações em que tentativas de melhorar a eficiência ou reduzir o impacto ambiental de um produto ou serviço acabam, paradoxalmente, aumentando o consumo ou os impactos ambientais, ao invés de diminuí-los.

Leia a definição completa no glossário.

Na aplicação das estratégias desses “Rs” e práticas correspondentes, devemos avaliar os possíveis efeitos rebote, que muitas vezes podem ser “evitados” se o comportamento das pessoas estiver alinhado com as abordagens de sustentabilidade ou economia circular. A mudança de comportamento relaciona-se com a aplicação da estratégia de “refletir”, a primeira da compilação apresentada.

No entanto, a mentalidade das pessoas, que molda os comportamentos, é apenas um dos aspectos de como mitigar os efeitos rebote.

Esse fenômeno é multidimensional e complexo e ainda deve ser estudado para melhorar o nosso entendimento para apoiar a determinação de ações para mitigação dos efeitos rebote. Políticas públicas podem influenciar e a avaliação da sustentabilidade absoluta pode contribuir para que se consiga definir quais são os limites que não devemos ultrapassar em termos de aspectos e impactos ambientais e sociais. Não é uma tarefa simples.

Leia mais sobre isso na seção da flexM4i “Efeitos rebote de iniciativas da economia circular”.

 

Os agrupamentos dos “Rs” e frameworks

Recomendamos este tópico para os leitores do nível de detalhamento avançado que desejam ter uma visão ampla dos agrupamentos dos “Rs” da sustentabilidade

Apresentamos aqui exemplos de agrupamentos dos “Rs” de sustentabilidade. Alguns agrupamentos podem ser considerados frameworks mais estruturados, cuja “ordem” dos “Rs” possui um significado que pode apoiar a sua seleção.

Normalmente, um framework traz uma categorização das estratégias de sustentabilidade. Novos frameworks são constantemente desenvolvidos para sistematizar a aplicação de estratégias e práticas de sustentabilidade e economia circular.​

Na seção sobre economia circular mostramos:

No início eram 3Rs

No início, usava-se o termo 3Rs para conotar “reduzir, reusar e reciclar”. A ênfase maior era na reciclagem, o que ainda é realidade em muitos lugares. No entanto, os custos e a energia necessários para se reciclar provocaram um aumento do uso das estratégias de reduzir e reusar (Leslie et al., 2021). Ainda hoje essas são as estratégias mais citadas.

Evoluíram para 5Rs

Uma proposta definiu 5Rs: rejeitar, reduzir, reusar, redirecionar (repurpose) e reciclar. Esses 5 Rs foram representados como um funil, como ilustra a próxima figura.

Figura 934: representação dos 5Rs da sustentabilidade na forma de funil

Algumas propostas de 6Rs e várias de 7Rs

Alguns autores citam os 6Rs da sustentabilidade. Acima do rejeitar, da figura anterior, foi inserido o repensar e no lugar do redirecionar, foi inserido o reparar. Então, os 6Rs da sustentabilidade ficaram: repensar, rejeitar, reduzir, reusar, reparar e reciclar.

O quadro abaixo mostra uma amostra de propostas de 7Rs.

Quadro 935: alguns exemplos de 7Rs da sustentabilidade

A proposta 1 pode ser acessada nesses links: Proposta Galrão e Leonardo Borges
A proposta 2 pode ser acessada nesse link: IDEC
A proposta 3 pode ser acessada nesse link: MIPMED
A proposta 4 pode ser acessada nesse link: Aeromatico

Esses são somente alguns exemplos para ilustrar a variedade de definições dos 7Rs. A maioria das referências apresentadas é relacionada com atitudes pessoais e não estratégias empresariais.

Na área de embalagens, Brodnjak et al. (2022) partiram de uma visão de tratamento dos resíduos ilustrados na próxima figura (6Rs) e chegaram uma proposta dos 7Rs, ilustradas na figura subsequente.

Figura    936: hierarquia dos resíduos da indústria de embalagens
Fonte: adaptado de Brodnjak et al. (2022) 

Figura 937: o framework dos 7 Rs de embalagens sustentáveis
Fonte: adaptado de Brodnjak et al. (2022)  

A figura anterior é equivalente a proposta 4 do quadro que apresenta alguns exemplos de estratégias, porém relacionadas com embalagens. O reintegrar daquele quadro é o rot, que normalmente abrange a compostagem de algum material orgânico.

  1. Repensar o design dos produtos e das embalagens para diminuir o impacto;
  2. Rejeitar embalagens exageradas e o uso de plástico;
  3. Reusar embalagens;
  4. Reduzir as embalagens modificando características do produto;
  5. Redirecionar combina o reusar e o reciclar com base no projeto de embalagens que podem ser usadas em outros aplicações;
  6. Reciclar os materiais das embalagens, graças a um design apropriado;
  7. Reintegrar (rot) Utilizar material biodegradável nas embalagens ou orgânicos para que eles possam ser decompostos e seus nutrientes reaproveitados

Propostas de 8 a 10Rs

Também existe a proposta dos 8Rs, que introduz ainda:  “reciclar corretamente”, “remover” (o lixo espalhado) e o “repassar (rally)”,

Uma outra proposta dos 8Rs consiste de: refletir, reduzir, reutilizar (reusar), reciclar, respeitar, reparar, responsabilizar-se, repassar.

A proposta de 9Rs introduziu as estratégias de recondicionar, remanufaturar e recuperar energia, resultando em: rejeitar, reduzir, reusar, reparar, recondicionar, remanufaturar, redirecionar (repurpose), reciclar e recuperar energia (van Buren et al., 2016).

Existem propostas de 10 Rs: rejeitar, repensar, reduzir, reusar, reparar, reciclar, reintegrar, respeitar, responsabilizar-se, repassar. Veja que ficaram de fora desta proposta, em comparação com a anterior as seguintes estratégias: recondicionar, remanufaturar, redirecionar (repurpose) e recuperar energia.

Estudo e framework de Reike, Vermeulen & Witjes (2018)

Reike, Vermeulen & Witjes (2018) realizaram um levantamento de 69 “Rs” da sustentabilidade (estratégias), que foram extraídas das seguintes disciplinas de conhecimento:

  • gestão de resíduos e ciências ambientais
  • logística reversa e gestão da cadeia de suprimentos com looping-fechado
  • design de produtos e produção mais limpa
  • ecologia industrial
  • economia circular (depois de 2010).

 Eles constataram que foram empregados 38 diferentes termos iniciados por “R”: re-assembly, recapture, reconditioning, recollect, recover, recreate, rectify, recycle, redesign, redistribute, reduce, re-envision, refit, refurbish, refuse, remarket, remanufacture, renovate, repair, replacement, reprocess, reproduce, repurpose, resale, resell, re-service, restoration, resynthesize, rethink, retrieve, retrofit, retrograde, return, reuse, reutilise, revenue, reverse and revitalize. Essas estratégias foram estruturadas em grupos de 3Rs a 10 Rs. E surpreendentemente, para os autores, a tipologia de “3Rs” é a mais utilizada na literatura de economia circular (depois de 2010) com diversas variações, tais como:

  • reduzir, reutilizar e reciclar (a mais utilizada);
  • reutilizar, remanufaturar e reciclar;
  • reduzir, recuperar e reutilizar;
  • reutilizar, reciclar  e retornar;
  • reciclar, reutilizar e receita (Sic!);
  • reutilizar, recuperar e reciclar.
Segundo os autores, essa falta de consenso sobre quais “Rs” fazem parte de cada grupo e qual a sua hierarquia (quem vem primeiro) se repete nos outros agrupamentos do ‘Rs”.

Neste estudo, as estratégias de economia circular foram classificadas em duas fases do ciclo de vida de produtos:

  • conceito e design do produto;
  • produção e uso.

A síntese das estratégia contém a seguinte hierarquia:

  • R0: rejeitar ou recusar (refuse) – tanto do ponto de vista do consumidor, como do produtor;
  • R1: reduzir;
  • R2: reutilizar ou revender;
  • R3: reparar;
  • R4: recondicionar;
  • R5: remanufaturar;
  • R6: repropor ou redirecionar;
  • R7: reciclar materiais;
  • R8: recuperar (energia);
  • R9: reminerar.

Os autores dividiram essas 10 estratégias em três tipos de loopings:

  • looping curto,  envolve atividades próximas dos clientes e outros agentes que podem se envolver para estender a vida dos produtos. Este looping abrange as estratégias (R0-R): rejeitar ou recusar; reduzir; reutilizar ou revender; e reparar.
  • looping médio, atividades de negócios com envolvimento indireto dos clientes, que comprariam produtos recondicionados etc. Este looping abrange as estratégias (R4-R6): recondicionar; remanufaturar; e repropor ou redirecionar.
  • looping longo, recupera materiais depois de muito tempo de uso, que podem ser utilizados como insumos nas estratégias dos outros loopings mais curtos.  Este looping abrange as estratégias (R7-R9): reciclar materiais; recuperar (energia); e reminerar.
O estudo de Reike, Vermeulen & Witjes (2018) possuía 1256 citações em 3/7/2023 no Google Scholar. Consulte a publicação original para conhecer uma descrição detalhada dessas estratégias e outros resultados deste estudo que as relaciona com a servitização e outras práticas de economia circular.

Relatório e framework de Potting et al. (2017)

Potting et al. (2017) publicaram um relatório para a agência de proteção ambiental dos Países Baixos e utilizaram a categorização das estratégias de economia circular proposta por Rli (2015).

O relatório de Potting et al. (2017) possuía 951 citações em 3/7/2023 no Google Scholar

Eles definiram três categorias e suas características, conforme ilustrado na próxima figura.

Figura 938: estratégias de economia circular dentro de uma cadeia produto em ordem de prioridade (a mais prioritária está no nível superior da figura).
Adaptado de Potting et al. (2017) 

Uma contribuição deste framework são as diretrizes que apoiam a decisão de qual estratégia selecionar: 

  • Quanto mais elevado o nível de circularidade, menos recursos naturais são necessários.
  • Para se conseguir uma maior eficácia na reciclagem e recuperação (da energia com a incineração dos materiais), devemos realizar inovações tecnológicas.
  • Conforme adotamos as estratégias de economia circular de maior nível de prioridade na figura anterior, ou seja, estratégias de maior circularidade, temos de empregar sucessivamente: inovações no design dos produtos, no modelo de negócio até realizar mudanças sócio-institucionais.

Na verdade, esse framework mostra uma ordem de prioridade para seleção de uma estratégia:

  • R0: rejeitar ou recusar (refuse);
  • R1: repensar;
  • R2: reduzir;
  • R3: reutilizar ou redistribuir;
  • R4: reparar;
  • R5: recondicionar, reformar;
  • R6: remanufaturar;
  • R7: repropor ou redirecionar;
  • R8: reciclar;
  • R9: recuperar.
Este framework foi adotado como ponto de partida para a criação do Circular Strategies Scanner, que representa uma evolução das categorias de estratégias de sustentabilidade com foco na economia circular, que não se limita a apresentar estratégias, cuja denominação inicia com a letra “R”.

Frameworks de estratégias de economia circular

Conforme a economia circular evoluiu no meio empresarial e diversas agências aumentaram o fomento de pesquisas nessa área, surgiram diversas propostas de estruturação dessas estratégias, como a do Potting et al. (2017), apresentada no tópico anterior.

No início, esses autores estruturam os “Rs” da sustentabilidade como estratégias de economia circular. Porém, com a maturidade dos trabalhos nessa área, alguns trabalhos complementaram os “Rs” com estratégias, cuja denominação não se inicia com “R” e desenvolveram categorias mais intuitivas para apoiar a seleção de estratégias de economia circular, como o Circular Strategies Scanner, que já citamos nesta seção.

Alguns trabalhos desenvolveram categorias (ou framework de classificação) de estratégias de economia circular voltados para segmentos de mercado e tecnologia mais específicos. Isso faz sentido, pois conforme uma área de conhecimento evoluiu, percebe-se que não existe o “one-size-fits-all” e propostas mais específicas facilitam a adoção para determinados segmentos.

Veja outras categorias e frameworks no tópico “Estratégias da economia circular” da seção sobre economia circular.

Conhecer as estratégias “mais genéricas” (como a dos “Rs” da sustentabilidade) podem trazer novos insights para quem deseja definir estratégias e práticas de sustentabilidade / economia circular para a sua empresa.

Referências

Brodnjak, U. V., & Jestratijević, I. (2022). Solutions of Sustainable Packaging in Footwear and Apparel Industry. International Symposium on Graphic Engineering and Design, 533–538. https://doi.org/10.24867/GRID-2022-p59 

Leslie, C. M., Strand, A. I., Ross, E. A., Ramos, G. T., Bridge, E. S., Chilson, P. B., & Anderson, C. E. (2021). Shifting the balance among the ‘three rs of sustainability:’ what motivates reducing and reusing? Sustainability (Switzerland), 13(18), 1–12. https://doi.org/10.3390/su131810093

Potting, J., Hekkert, M., Worrell, E., & Hanemaaijer, A. (2017). Circular economy: Measuring innovation in the product chain. PBL Netherlands Environmental Assessment Agency, 2544, 42.

Reike, D., Vermeulen, W. J. V., & Witjes, S. (2018). The circular economy: New or Refurbished as CE 3.0? — Exploring Controversies in the Conceptualization of the Circular Economy through a Focus on History and Resource Value Retention Options. Resources, Conservation and Recycling, 135(August 2017), 246–264. https://doi.org/10.1016/j.resconrec.2017.08.027

Tannu, S. & Nair, P. J. (2022). The Dirty Secret of SSDs: Embodied Carbon. Disponível em: https://arxiv.org/pdf/2207.10793.pdf Acesso em: 29 Jul 2023.

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