Estruturas organizacionais segundo Mintzberg
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Autoria: Henrique Rozenfeld ([email protected]) com apoio do chatGPT (leia mais).
Conteúdo desta página
- 1 Introdução
- 2 Elementos centrais do modelo
- 3 As configurações estruturais propostas por Mintzberg
- 4 Forças que moldam a estrutura organizacional: entre dinâmica interna, contexto e escolha estratégica
- 5 Críticas e limitações do modelo de Mintzberg
- 6 Trajetórias e flexibilização das configurações estruturais
- 7 Implicações para a gestão da inovação
- 8 Leituras complementares para aprofundamento
- 9 Procedimentos e apoio do chatGPT
- 10 Referências
Introdução
A estrutura organizacional é um dos elementos que compõem a arquitetura organizacional de uma empresa, ao lado de outros componentes como processos e governança, pessoas e liderança, indicadores e incentivos, clima e cultura organizacional. Esses elementos não atuam isoladamente, mas se influenciam mutuamente por meio de relações de causa e efeito. Alterações na estrutura, por exemplo, podem afetar o clima organizacional, a dinâmica de liderança ou a lógica de governança — e vice-versa (como ilustra a próxima figura).
Figura 1213: elementos da arquitetura organizacional suas inter-relações e a estratégia
Adaptado de: Galbraith, J. R. (2014)
Essa figura é detalhada na seção “Arquitetura organizacional” da flexM4i. |
Normalmente, a estrutura organizacional é representada por um organograma. Como Mintzberg (2017) afirma no seu livro, que atualiza o seu clássico de 1979, com um novo título “Para entender as organizações… finalmente!” (edição em português)…
… “O organograma é a organização? […] As caixas do diagrama são os gerentes da organização, e as linhas entre eles suas conversas? Ou as caixas são apenas as paredes da nossa prisão?”, …
… a complexidade da estrutura organizacional vai muito além da disposição hierárquica de funções. Ela define como o trabalho é dividido, como as decisões são distribuídas, como a coordenação acontece e como os diferentes núcleos da organização se articulam entre si e com a estratégia.
Nesta seção da flexM4i, o foco está nas configurações estruturais propostas por Henry Mintzberg, um dos autores mais influentes da teoria organizacional. Seu modelo oferece uma tipologia útil para compreender como diferentes formas de estrutura respondem a contextos, objetivos e mecanismos de coordenação distintos.
Além de apresentar suas sete configurações estruturais, esta seção discute os componentes fundamentais do modelo, os fatores que moldam a estrutura e suas implicações para a gestão da inovação. O objetivo é oferecer ao leitor uma visão prática e crítica da estrutura organizacional como parte da arquitetura organizacional mais ampla — em diálogo constante com estratégia, cultura e contexto.
Elementos centrais do modelo
A figura a seguir representa as cinco partes da organização propostas por Mintzberg (1979, 2003), e foi adaptada para uso na flexM4i com termos mais usuais no contexto organizacional brasileiro. Essas partes, também chamadas de componentes ou atores organizacionais, são os elementos básicos que compõem qualquer estrutura organizacional. Eles interagem continuamente, moldando a forma como a organização divide e coordena seu trabalho.
Partes do modelo
Na terminologia original de Mintzberg, as cinco partes da organização são: topo estratégico, linha intermediária, núcleo operacional, tecnoestrutura e staff de apoio. Na figura acima, adotam-se os seguintes termos equivalentes, que serão utilizados nesta seção com eventuais indicações cruzadas:
- Diretoria → topo estratégico
- Linha média → linha intermediária
- Núcleo operacional → núcleo operacional
- Tecnoestrutura (analistas) → tecnoestrutura
- Pessoal de apoio → staff de apoio
Figura 1361: As cinco partes de uma estrutura organizacional segundo Mintzberg
Fonte: adaptado de Mintzberg (1979)
Esses cinco componentes se articulam por meio de diferentes mecanismos de coordenação (tema tratado a seguir) e são moldados por fatores contextuais, o que dá origem às diferentes configurações estruturais descritas posteriormente por Mintzberg.
- Núcleo operacional: É onde o trabalho principal da organização é realizado — seja fabricar produtos, prestar serviços, atender clientes ou operar sistemas. É formado por profissionais e operadores diretamente envolvidos na produção de valor.
- Diretoria (topo estratégico): Corresponde à alta administração, responsável por formular a estratégia e garantir que a organização cumpra sua missão. Engloba o CEO e os demais executivos com atuação global sobre a organização. Esse componente também exerce liderança simbólica, atua na interlocução com o ambiente externo e define diretrizes de longo prazo.
- Linha média (linha intermediária): Conecta a diretoria ao núcleo operacional. É composta por gestores que traduzem e implementam as decisões estratégicas em planos e ações operacionais. Essa camada supervisiona as operações, coordena equipes e garante o alinhamento entre diferentes níveis organizacionais.
- Tecnoestrutura (analistas): É formada por especialistas que projetam, padronizam e monitoram processos, sistemas e práticas. Inclui áreas como engenharia de processos, planejamento, qualidade, métodos, treinamento e controle. Esses profissionais não exercem autoridade direta, mas influenciam fortemente a forma como o trabalho é executado, por meio da padronização.
- Pessoal de apoio (staff de apoio): Abriga os serviços que dão suporte à organização, mas não integram diretamente o fluxo operacional principal. Exemplos incluem jurídico, TI, comunicação, RH, segurança e serviços gerais. Apesar de estarem fora do eixo diretoria–linha média–núcleo, esses serviços são essenciais para o funcionamento organizacional.
Exemplos de atores da tecnoestrutura e do pessoal de apoio
A alocação de áreas organizacionais às diferentes partes do modelo de Mintzberg pode servir tanto como ferramenta de análise quanto de design organizacional. A figura a seguir apresenta uma exemplificação clássica de atores associados à tecnoestrutura e ao pessoal de apoio, com base na prática observada em empresas.
Figura 1362: exemplos de atores que pertencem a tecnoestrutura e ao pessoal de apoio, segundo o modelo de Mintzberg
Atores da tecnoestrutura (analistas)
As áreas associadas à tecnoestrutura são aquelas que atuam padronizando processos, propondo métodos e estruturando sistemas de gestão. Elas influenciam diretamente o modo como o trabalho deve ser executado, mesmo sem estarem no fluxo operacional nem exercerem autoridade hierárquica.
- Organização e Métodos (OEM)
- Business Process Management (BPM)
- Centros de Excelência (CoE)
- Business Intelligence e Data Analytics
- Compliance
- Arquitetura Corporativa
- Gestão do Conhecimento
- Transformação Digital
- Qualidade (focada em normas e sistemas)
- ESG estratégico
- PMO estratégico
- RH estratégico
- TIC estratégico
Essas funções costumam operar com forte orientação a método, estrutura e desempenho organizacional, atuando como catalisadoras da eficiência, do controle e da transformação.
O declínio e a reinvenção da área de Organização e Métodos Marcamos na figura anterior a área de Organização e Métodos (OEM) em vermelho com um “X” para indicar que é algo ultrapassado. A área de OEM foi amplamente adotada entre as décadas de 1970 e 1990 como uma estrutura dedicada à racionalização dos processos de trabalho. Inspirada pelo modelo da burocracia mecanicista, ela buscava ganhos pontuais de produtividade por meio da análise de métodos e tempos, padronização de rotinas administrativas e elaboração de manuais. Com o tempo, a OEM passou a ser vista como excessivamente prescritiva, isolada da estratégia e descolada da realidade operacional. Isso contribuiu para seu enfraquecimento e, em muitos casos, para sua extinção. A crítica mais recorrente era sua tendência à padronização formalista, sem envolvimento com resultados integrados ou com a transformação organizacional mais ampla. Nas últimas décadas, no entanto, diversas práticas contemporâneas recuperaram funções equivalentes, ainda que com outras abordagens e nomes: Apesar das diferenças de linguagem e escopo, muitas dessas funções revivem o espírito da OEM — agora com foco ampliado, tecnologias digitais e alinhamento estratégico, indo além da busca por eficiência operacional isolada. |
Atores do pessoal de apoio (staff)
O pessoal de apoio engloba áreas e serviços que oferecem suporte indireto à organização, sem interferir diretamente na execução dos processos operacionais principais. Seu papel é garantir condições de funcionamento, conformidade ou segurança em diversas dimensões. Exemplos recorrentes incluem:
- Jurídico
- Comunicação corporativa e relações públicas
- Financeiro, contábil e fiscal
- Controladoria
- Suprimentos
- Logística
- Manutenção predial e infraestrutura
- Gestão de riscos e seguros
- Segurança do trabalho e saúde
- Auditoria interna
Além desses, há áreas cuja atuação pode variar entre o papel de apoio e o papel normativo, como:
- Qualidade (voltada a auditoria ou suporte operacional)
- ESG & Sustentabilidade (quando prestam apoio técnico)
- PMO operacional
- RH operacional
- TIC operacional
Como diferenciar tecnoestrutura de pessoal de apoio
Embora o modelo de Mintzberg proponha uma distinção clara entre tecnoestrutura e pessoal de apoio, na prática organizacional essa fronteira é cada vez mais difícil de traçar. Muitas áreas operam em zonas cinzentas, alternando entre atividades de suporte, normatização e padronização — e, por isso, exigem análise contextualizada para seu correto enquadramento. Mostramos a seguir dois exemplos: a área de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e o PMO (project management office) integrado.
Área de TIC: tecnoestrutura ou apoio?
A figura a seguir ilustra esse fenômeno por meio do exemplo da Tecnologia da Informação (TI), que pode assumir características simultâneas de tecnoestrutura e de pessoal de apoio, a depender da natureza das atividades realizadas.
Figura 1363: exemplos de atividades de uma área (função organizacional) de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) tanto tecnoestrutural como de apoio segundo o Modelo Organizacional de Mintzberg
TIC como tecnoestrutura
Quando a área de TI atua com foco em padronizar, estruturar e transformar a forma como o trabalho organizacional é realizado, ela se comporta como parte da tecnoestrutura. Nessa função, ela:
- Define padrões e arquiteturas corporativas (ex: arquitetura de dados, segurança da informação, integração de sistemas).
- Implanta e padroniza sistemas de gestão.
- Governa processos digitais, automações e acesso a dados.
- Estabelece políticas e normas para uso de tecnologia, gestão de mudanças e cibersegurança.
Essa atuação tem efeito transversal e estruturante, influenciando a forma de trabalhar de toda a organização, mesmo sem exercer autoridade formal.
TIC como pessoal de apoio
Por outro lado, quando a mesma área atua como suporte técnico direto, sua função se aproxima do pessoal de apoio. Nessa lógica, sua atuação inclui:
- Solução de chamados técnicos e problemas de usuários.
- Manutenção da infraestrutura de TI.
- Atendimento de demandas locais ou pontuais.
Aqui, o foco está em responder a solicitações, manter o funcionamento do ambiente técnico e prestar suporte reativo, não definindo regras nem processos organizacionais.
PMO integrado: tecnoestrutura ou apoio?
Também fica difícil diferenciar um PMO integrado com uma tecnoestrutura ou apoio.
Figura 1364: exemplos de atividades de um Escritório de Projetos (PMO) tanto tecnoestrutural como de apoio segundo o Modelo Organizacional de Mintzberg
O Escritório de Projetos (PMO) é outro exemplo de função organizacional com dupla natureza:
- PMO estratégico: estabelece metodologias, indicadores, rituais e critérios de priorização, definição de metricas e boas práticas, seleção de projetos e priorização estratégica — típica atuação de tecnoestrutura.
- PMO operacional: oferece apoio administrativo ou técnico aos projetos em andamento, como consolidação de indicadores, preparação de relatórios e controle de documentação — mais alinhado ao papel de staff de apoio.
Essas atividades de um PMO operacional podem ser realizadas por agentes de IA, a serem utilizadas e validadas por um gerente de projeto. |
Níveis de maturidade de um PMO.
A próxima figura ilustra os níveis de maturidade que um PMO pode assumir. No último nível de maturidade, com um alinhamento estratégico, esse elemento organizacional pode ser chamado de PMO integrado ou centro de excelência, entre outros.
Figura 1349: estágios de evolução das competências de um escritório de projetos (PMO – project management office) – clique na figura para abrir em outra aba
Fonte: adaptado de Hill (2013)
No nível de maturidade do estágio 1, as atribuições de um PMO são típicas de um staff de apoio. A partir do estágio 2, suas atribuições tornam-se de um escritório mais analista e estratégico.
Visite na flexM4i a seção específica sobre PMO, que explica a figura acima e traz outras características de um PMO no contexto da gestão da inovação. |
Importa diferenciar entre tecnoestrutural e de apoio?
A fronteira entre tecnoestrutura e pessoal de apoio torna-se mais fluida à medida que as organizações lidam com estruturas matriciais, funções híbridas e o fortalecimento de temas como ESG, transformação digital, gestão do conhecimento e analytics.
É cada vez mais difícil diferenciar tecnoestrutura de pessoal de apoio
A dificuldade de diferenciação não representa uma falha no modelo de Mintzberg, mas sim um indicativo de que as organizações contemporâneas funcionam em camadas sobrepostas, com estruturas híbridas e zonas de interseção. Classificar corretamente essas funções exige considerar:
- O tipo de contribuição predominante (normativa vs. suporte);
- A intenção estratégica da função;
- O grau de padronização imposto ao restante da organização;
- E a proximidade com o núcleo operacional ou com a direção organizacional.
Do ponto de vista prático, a pergunta atual é “vale a pena diferenciar? O modelo de Mintzberg explica diversos tipos de estruturas organizacionais. O importante é entender que alguns elementos organizacionais (áreas) podem ser considerados tecno-estruturas ou de apoio.
Os tópicos seguintes, discutem como a coordenação e os fatores contextuais afetam a estrutura — e como a descentralização emerge como um dilema recorrente na tentativa de definir a arquitetura organizacional “ideal”.
“Ideal” porque nunca vamos atingir. Sempre devemos experimentar, incorporar novas tecnologias (que cada vez mais influenciam a estrutura), considerar a influência dos outros componentes da arquitetura organizacional (como mostramos na introdução) e mudar. A mudança é uma constante, sempre perseguindo um novo patamar de desempenho. |
As configurações estruturais propostas por Mintzberg
Após apresentar os elementos centrais da estrutura organizacional, este tópico trata das configurações estruturais integradas descritas por Mintzberg. Ao combinar as partes organizacionais, os mecanismos de coordenação (*) e os fatores contextuais (*), o autor propõe tipos recorrentes de estrutura, que ele chama de configurações estruturais.
(*) os mecanismos de coordenação e os fatores contextuais são descritos após a apresentação dos tipos de estruturas organizacionais
Essas configurações não são prescrições ideais, mas padrões organizacionais que emergem com frequência na prática. Elas funcionam como modelos-tipo para entender como diferentes organizações estruturam seu trabalho, delegam autoridade, coordenam decisões e se adaptam ao ambiente.
Mintzberg apresenta cinco configurações principais (depois ampliadas para seis com a estrutura missionária e, posteriormente, para sete com a inclusão da estrutura política):
- Estrutura simples
- Burocracia mecanicista
- Burocracia profissional
- Forma divisionalizada
- Adhocracia
- Estrutura missionária (acrescentada posteriormente)
- Estrutura política
Nos tópicos a seguir, cada uma dessas configurações será descrita com base em seus traços dominantes, vantagens, limitações e contexto de aplicação.
Estrutura simples (empreendedora)
A estrutura simples é a configuração organizacional mais básica e direta. É composta, essencialmente, por um núcleo operacional e uma cúpula estratégica, com mínima linha média, pouca ou nenhuma tecnoestrutura e suporte limitado. A coordenação é realizada principalmente por meio de supervisão direta, concentrando a autoridade decisória na figura do fundador ou líder central.
Essa estrutura é comum em pequenas empresas, startups e organizações recém-formadas, especialmente quando lideradas por pessoas com forte visão empreendedora. A centralização favorece rapidez na tomada de decisão, o que é crítico em ambientes instáveis e de alta incerteza — como os contextos de inovação nascente.
Figura 1365: ícone que representa uma estrutura empreendedora (simples) segundo Mintzberg
Nota sobre a figura: A imagem representa uma estrutura organizacional simples, também conhecida como estrutura empreendedora, conforme o modelo de Mintzberg. O bloco superior simboliza a diretoria (topo estratégico), que exerce supervisão direta sobre o bloco inferior, correspondente ao núcleo operacional. A ausência de elementos laterais indica que não há linha média desenvolvida, nem funções estruturadas de apoio ou tecnoestrutura. Essa visualização reforça a centralização típica desse modelo: decisões estratégicas e operacionais estão concentradas em poucas pessoas, geralmente no fundador ou líder central. |
Mecanismo de coordenação dominante: Supervisão direta
Características principais:
- Estrutura informal, centralizada e com baixa formalização
- Forte liderança individual
- Pouca divisão de trabalho ou departamentalização
- Alta flexibilidade e capacidade de resposta rápida
Contexto favorável:
- Ambientes dinâmicos e simples
- Fases iniciais de negócios
- Projetos experimentais com equipes enxutas
Pontos positivos:
- Velocidade de resposta e clareza de propósito
- Energia e entusiasmo do líder empreendedor
- Criatividade e proximidade com o cliente ou mercado
Pontos negativos:
- Vulnerabilidade ao erro de julgamento individual
- Poucos recursos limitam o crescimento
- Riscos de estagnação e dependência de pessoas-chave
- Dificuldade de profissionalização e sucessão
A estrutura simples pode ser uma solução adequada no início do ciclo de vida organizacional, mas apresenta desafios à medida que a empresa cresce. O excesso de centralização torna-se um gargalo, exigindo a construção de linha média, funções de apoio e mecanismos mais estruturados de coordenação.
Exemplos de estruturas empreendedoras (simples):
- Startups em estágio inicial: pequenos times liderados pelos fundadores, que concentram todas as decisões e operam com processos informais. A estrutura é centralizada e flexível, ideal para ambientes de incerteza.
- Empresas familiares de pequeno porte: negócios em que um ou dois membros da família controlam diretamente todas as atividades, com pouca formalização e forte influência pessoal nas decisões.
- Agências criativas ou consultorias nascente: organizações enxutas, com liderança carismática ou técnica centralizada, onde a coordenação ocorre por contato direto e flexibilidade de papéis.
- Profissionais autônomos com equipe enxuta: escritórios de arquitetura, engenharia ou advocacia organizados em torno de um profissional sênior e colaboradores que atuam sob sua supervisão direta.
- Negócios locais ou informais: comércios, oficinas e serviços que funcionam com estruturas mínimas, decisões rápidas e vínculos diretos entre liderança e operação.
No próximo tópico, será apresentada a burocracia mecanicista, estrutura mais estável e formalizada, comum em ambientes previsíveis e operações rotineiras.
Burocracia mecanicista (burocracia mecanizada)
Essa estrutura é predominante em organizações que operam com grande volume, tarefas rotineiras e sistemas bem estabelecidos, como indústrias de produção em massa, serviços públicos ou empresas que priorizam controle e eficiência operacional.
Figura 1366: ícone que representa uma estrutura mecanicista segundo Mintzberg
Mecanismo de coordenação dominante: : padronização dos processos de trabalho
Características:
- Tarefas repetitivas,
- Regras rígidas,
- Forte hierarquia,
- Formalização intensa,
- Tecnicidade e alta divisão do trabalho.
- O poder é centralizado, com a execução sendo altamente sistematizada para garantir uniformidade e controle.
Ambiente: estável e simples (previsível)
Muitas empresas mecanicistas atuam em ambientes complexos, como multinacionais, setores regulados, mercados com cadeias logísticas sofisticadas etc.
O que Mintzberg considera como “ambiente simples” refere-se a pouca diversidade e pouca ambiguidade na informação necessária para operar. Mas na prática, muitas organizações em ambientes altamente complexos optam pela burocracia mecanicista como uma tentativa de reduzir a incerteza interna, mesmo que o contexto externo exija flexibilidade. Ainda que possa haver complexidade externa, a estrutura mecanicista é eficaz quando os processos podem ser formalizados e repetidos internamente, ou seja, quando ele se torna previsível. |
Pontos positivos:
- Capacidade de lidar com processos complexos e integrados
- Estabilidade e previsibilidade
- Êxito baseado na construção de sistemas eficazes que simplificam tarefas repetitivas e reduzem variações
Pontos negativos:
- Potencial de alienação dos indivíduos em tarefas repetitivas
- Rigidez dos sistemas e dificuldade de adaptação
- Baixa flexibilidade para mudanças e inovação incremental
- Dependência de especialistas externos para inovar
- Inibição da criatividade de não especialistas
Essa estrutura é eficaz quando a eficiência e a confiabilidade são prioritárias, mas pouco adequada a contextos que demandam agilidade, inovação contínua ou adaptação frequente. Em muitos casos, organizações mecanicistas criam unidades paralelas (como laboratórios de inovação ou unidades autônomas) para lidar com demandas que sua estrutura principal não acomoda.
Exemplos de organizações com estrutura mecanicista:
- Indústrias de produção em massa: montadoras de veículos, fabricantes de eletrodomésticos e empresas de bens de consumo duráveis operam com tarefas repetitivas, processos otimizados e forte padronização.
- Órgãos públicos e repartições governamentais: instituições como INSS, cartórios ou secretarias municipais, que operam com normas, fluxos formais e pouca margem de adaptação individual.
- Empresas de serviços operacionais padronizados: operadoras de call center, redes de fast food e empresas de logística que priorizam eficiência, tempo de resposta e repetibilidade das tarefas.
- Organizações com certificações rigorosas: empresas que operam em setores regulados (como farmacêuticas ou indústrias químicas), onde o cumprimento de procedimentos é obrigatório.
- Centrais de serviços compartilhados (CSC): departamentos internos que concentram atividades como contabilidade, folha de pagamento ou atendimento a fornecedores, organizados com base em SLAs e processos formalizados.
Burocracia profissional
A burocracia profissional é uma estrutura baseada na padronização das habilidades como principal forma de coordenação. Os profissionais que compõem o núcleo operacional são altamente qualificados, operam com autonomia técnica e são formados fora da organização (em universidades, conselhos ou com certificações).
Essa configuração é comum em organizações onde o conhecimento especializado é a base da entrega de valor — e onde o controle formal é substituído por credenciais e normas profissionais. A autoridade é distribuída horizontalmente, com relativa independência entre os profissionais.
Figura 1367: ícone que representa uma estrutura de burocracia profissional segundo Mintzberg
Nota sobre a figura: Na representação visual da burocracia profissional, a tecnoestrutura aparece reduzida e o pessoal de apoio é ampliado. Isso reflete a natureza dessa configuração:
Esse desenho mostra que, na burocracia profissional, a força está no núcleo operacional autônomo, e não na estrutura de controle. |
Coordenação: padronização das habilidades
Características:
- Descentralização horizontal
- Profissionais com alta qualificação e autonomia
- Trabalho estruturado por normas e padrões profissionais externos
- Baixo grau de supervisão direta
- Ênfase na formação técnica e na confiança em pares
Ambiente: estável e previsível, mas com alta complexidade técnica no núcleo
Pontos positivos:
- Níveis elevados de capacidade técnica e conformidade com padrões profissionais
- Capacidade de resolver problemas complexos com base em conhecimento especializado
- Boa articulação entre profissionais por meio de normas compartilhadas
- Alta confiabilidade técnica e ética na execução das atividades
Pontos negativos:
- Dificuldade de se gerenciar indivíduos com autonomia elevada e conhecimento técnico superior
- Tendência à fragmentação ou formação de silos profissionais
- Baixa flexibilidade em práticas fora da zona de especialidade
- Resistência a mudanças impostas de cima para baixo
Mudanças impostas de cima para baixo são mudanças que vêm da alta gestão ou da diretoria — por exemplo:
Por que há resistência?
Exemplo: |
Exemplos de organizações com estrutura de burocracia profissional:
- Hospitais: médicos, enfermeiros e outros profissionais da saúde atuam com autonomia técnica baseada em formação externa e normas profissionais. A coordenação ocorre por meio de protocolos clínicos e especializações.
- Universidades e centros de pesquisa: docentes e pesquisadores trabalham com independência acadêmica, seguindo padrões científicos e critérios de avaliação definidos por suas comunidades disciplinares.
- Escritórios especializados de contabilidade, direito, engenharia e arquitetura: profissionais certificados realizam trabalhos complexos com base em regulamentos externos e padrões técnicos reconhecidos.
- Grandes firmas de consultoria técnica: consultores seniores operam com relativa autonomia, seguindo metodologias próprias ou normativas do setor (por exemplo, auditoria, sustentabilidade, tecnologia, regulação).
- Agências reguladoras ou certificadoras técnicas: órgãos como agências sanitárias, ambientais ou de infraestrutura que contam com corpo técnico especializado para tomar decisões baseadas em conhecimento normativo e científico.
Estrutura divisionalizada
A estrutura divisionalizada é adotada por grandes organizações que operam em múltiplos mercados, regiões, produtos ou linhas de negócio. Nela, a organização é dividida em unidades semiautônomas, cada uma com seu próprio conjunto de funções e responsabilidade por resultados. A coordenação não ocorre por processos ou normas detalhadas, mas pela padronização dos resultados, com metas e indicadores definidos pelo centro corporativo.
A figura ilustra essa lógica: o topo estratégico e os elementos de suporte (à direita) estão conectados a várias divisões abaixo, cada uma operando como um pequeno “negócio” dentro da organização maior.
Figura 1368: ícone que representa uma estrutura divisionalizada segundo Mintzberg
Coordenação: padronização dos resultados
Características:
- Organização dividida em divisões semiautônomas (por mercado, produto, região ou cliente)
- Cada divisão possui estrutura funcional própria
- A sede define metas, indicadores e critérios de avaliação de desempenho
- O centro corporativo exerce coordenação estratégica e financeira
- A linha média é fortalecida e funciona como elo entre sede e divisões
Ambiente: diversos mercados e produtos, geralmente com alta diversidade externa e necessidade de adaptação local
Pontos positivos:
- Capacidade de focar em nichos específicos de mercado ou regiões
- Rapidez na adaptação às demandas locais
- Suporte centralizado permite ganhos de escala em serviços como P&D, finanças e TI
- Possibilidade de replicar modelos organizacionais em diferentes frentes de negócio
Pontos negativos:
- Atrito e competição entre divisões, dificultando o compartilhamento de boas práticas
- Risco de duplicação de esforços ou soluções redundantes
- Esforços locais podem se desconectar da estratégia corporativa ou do P&D central
- Tendência ao isolamento das divisões e dificuldade de integração organizacional
Exemplos de organizações com estrutura divisionalizada:
- Multinacionais com marcas ou unidades regionais: empresas como Unilever, Nestlé ou GE operam com divisões por linhas de produto (ex: alimentos, cuidados pessoais) ou regiões (América Latina, Europa, Ásia), cada uma com sua estrutura funcional própria.
- Montadoras e grupos automotivos: grandes grupos industriais como Stellantis ou Volkswagen têm divisões por marcas (Peugeot, Fiat, Audi etc.) ou plataformas, cada uma com autonomia operacional.
- Grupos financeiros ou de saúde: bancos com unidades voltadas a diferentes perfis de cliente (varejo, corporate, alta renda) ou redes hospitalares com unidades autônomas integradas a uma central corporativa.
- Empresas de bens de consumo com portfólios diversos: empresas como Procter & Gamble, Johnson & Johnson ou 3M, com divisões especializadas por área de negócio.
Estrutura adhocrática (projetos exploratórios / inovação)
A adhocracia é uma configuração organizacional caracterizada por flexibilidade extrema, estrutura orgânica e coordenação por ajuste mútuo. É voltada à experimentação, à inovação e à resolução de problemas complexos, com forte uso de equipes temporárias e interdisciplinares. A autoridade é descentralizada e distribuída entre os especialistas, que colaboram de forma não hierárquica.
É a estrutura mais adequada para lidar com ambientes dinâmicos, incertos e complexos, nos quais não há rotinas predefinidas e o aprendizado ocorre em tempo real.
Figura 1369: ícone que representa uma estrutura estrutura adhocrática segundo Mintzberg
Nota sobre a figura: A figura representa a natureza fluida da adhocracia, destacando a ausência de fronteiras entre as partes da organização. O bloco central alargado indica que os papéis de análise, suporte e decisão estão distribuídos dentro das equipes de projeto, e não separados em departamentos formais. A base tracejada reforça a fragilidade da estrutura hierárquica tradicional, já que não há supervisão direta nem divisão rígida entre apoio e execução. Essa representação expressa uma organização voltada à inovação e à resolução de problemas complexos, na qual a coordenação se dá por ajuste mútuo e as equipes se formam e se desfazem conforme a necessidade. Pensar, decidir e executar acontecem num mesmo fluxo — e a separação entre staff de apoio e núcleo operacional torna-se praticamente irrelevante. |
Coordenação: ajuste mútuo
Características:
- Estrutura orgânica, flexível e horizontal
- Equipes formadas por especialistas de diferentes áreas
- Fraca formalização de papéis e processos
- Autoridade baseada em competência e não em posição hierárquica
- Projetos formados e desfeitos conforme a necessidade
Ambiente: dinâmico e complexo
Pontos positivos:
- Capacidade de lidar com altos níveis de incerteza
- Níveis elevados de criatividade, aprendizado e adaptabilidade
- Rápida experimentação e exploração de novas soluções
- Integração de múltiplas competências técnicas e estratégica
Pontos negativos:
- Altamente vulnerável a conflitos interpessoais ou interfuncionais
- Ausência de cadeia de comando clara dificulta decisões rápidas em situações críticas
- Processos informais podem gerar confusão ou sobreposição de papéis
- Riscos de descontinuidade e perda de conhecimento entre projetos
Exemplos de organizações com estrutura adhocrática:
- Consultorias de inovação e design estratégico: empresas como IDEO ou Fjord (Accenture) organizam-se em times temporários com base em projetos específicos, formados por perfis diversos.
- Startups em fase de crescimento com múltiplas frentes de inovação: à medida que amadurecem, algumas startups deixam a estrutura simples e adotam práticas adhocráticas, organizando-se em equipes autônomas com alto grau de liberdade para explorar soluções, validar hipóteses e desenvolver projetos em paralelo (nessa fase, elas ainda são chamadas de startups, mas já operam como scale-ups).
- Laboratórios exploratórios de grandes corporações: como o Google X (da Alphabet), Bell Labs (da Nokia) ou BMW Startup Garage — estruturas criadas deliberadamente fora da lógica operacional da empresa.
- Instituições de pesquisa e exploração tecnológica: como NASA ou DARPA, que organizam seus esforços em projetos autônomos de alta complexidade e risco tecnológico.
Existem termos que muitas vezes são utilizados para se referir a estrutura adhocrática, mas que não representam com precisão o significado da adhocracia, como mostramos na tabela abaixo.
Tabela 1371: termos comumente associados à adhocracia.
Termo | Similaridades com adhocracia | Diferenças ou limitações |
---|---|---|
Estrutura projetizada | Organiza-se em torno de projetos temporários e equipes multidisciplinares | Pode existir dentro de estruturas mecanicistas; nem sempre há autonomia real |
Organização ágil | Foco em times autônomos, ciclos curtos, colaboração e adaptação contínua | Usa métodos específicos (ex: Scrum); muitas vezes limitada ao desenvolvimento de software |
Estrutura inovadora | Voltada à criatividade, experimentação e resolução de problemas novos | É um rótulo amplo e genérico; pode coexistir com estruturas formais tradicionais |
Organização orgânica | Baixa formalização, comunicação informal, redes flexíveis | Termo mais amplo da teoria organizacional; não necessariamente centrado em projetos |
Organização em rede | Estrutura descentralizada, colaboração entre unidades e atores independentes | Pode ser interorganizacional; nem sempre há equipes temporárias ou projetos internos |
Esses termos são usados em diferentes contextos e com diferentes ênfases. A adhocracia, segundo Mintzberg, é uma configuração específica que combina estrutura orgânica, equipes temporárias, coordenação por ajuste mútuo e forte orientação à resolução de problemas complexos e inovação. Muitos desses modelos se inspiram na adhocracia, mas não a substituem completamente.
Estrutura missionária
A estrutura missionária é baseada na padronização de normas, valores e crenças compartilhadas como principal mecanismo de coordenação. A coesão organizacional ocorre por meio de um forte alinhamento cultural, onde os membros agem de forma consistente não por controle formal, mas porque compartilham uma missão comum.
Essa configuração é típica de organizações em que o propósito coletivo tem um papel mobilizador central — e onde a identidade organizacional supera hierarquias ou processos estruturados.
Figura 1370: ícone que representa uma estrutura estrutura missionária (esse ícone foi gerado pelo chatGPT com base em uma descrição do autor desta seção, não existe na referência bibliográfica)
Nota sobre a figura: Mesmo que a estrutura missionária apresente elementos funcionais ou operacionais tradicionais, é a missão compartilhada que atua como principal eixo de coesão e coordenação. A figura representativa, quando usada, destaca a centralidade da cultura e dos valores, em detrimento da hierarquia ou da divisão clássica de papéis. |
Coordenação: padronização de normas e crenças
Características:
- Cultura organizacional forte e internalizada
- Valores e missão compartilhados orientam comportamentos e decisões
- Estrutura formal pode existir, mas é secundária em relação à identidade coletiva
- Membros se auto regulam com base na adesão aos princípios da organização
Ambiente: variável, mas com forte coesão interna
Pontos positivos:
- Alta motivação e senso de pertencimento entre os membros
- Baixa necessidade de controle formal, com autorregulação natural
- Fortes vínculos com causas sociais, espirituais ou ideológicas
- Capacidade de mobilizar esforços em direção a um propósito comum
Pontos negativos:
- Risco de dogmatismo ou resistência a mudanças externas
- Dificuldade de absorver novos membros ou ideias divergentes
- Possível negligência de aspectos técnicos e operacionais em nome da missão
- Alinhamento cultural pode inibir a diversidade de pensamento
Exemplos de organizações com estrutura missionária:
- Organizações religiosas e ordens espirituais: como congregações católicas, grupos budistas ou movimentos evangélicos estruturados, onde a doutrina orienta tanto a ação individual quanto coletiva.
- ONGs e movimentos sociais: entidades como Greenpeace, Médicos Sem Fronteiras ou escoteiros, nas quais os membros atuam movidos por valores compartilhados e missão social.
- Empresas com cultura organizacional forte e evangelizada: alguns casos de empresas como Patagonia, Natura ou Zappos, onde o discurso de missão é incorporado de forma intensa ao cotidiano organizacional.
- Organizações comunitárias ou cooperativas de base solidária: iniciativas onde o valor da cooperação e o propósito coletivo guiam o funcionamento, mesmo com estrutura funcional formal.
A estrutura missionária não é uma estrutura no sentido clássico funcional
É mais um mecanismo de integração ideológica que pode conviver com outras configurações formais.
Mintzberg trata a estrutura missionária como uma configuração autônoma, mas na prática ela frequentemente coexiste com outras formas organizacionais. O que a caracteriza não é a forma como as tarefas são distribuídas ou os departamentos organizados, mas sim o mecanismo dominante de coordenação, que ocorre por meio da padronização de normas, valores e crenças compartilhadas.
Isso significa que uma organização com forte cultura missionária pode adotar diferentes formas estruturais para sustentar suas operações, dependendo de seu porte, dispersão geográfica, complexidade e objetivos administrativos.
Por exemplo:
- Uma organização religiosa local de pequeno porte pode operar com base em uma estrutura simples, com forte centralização no líder-fundador, funcionamento informal e decisões diretas — enquanto sua coesão interna se dá por alinhamento à missão espiritual.
- Já algumas organizações com hierarquia rígida, forte repetição de rituais e normas padronizadas podem exibir traços de uma estrutura mecanicista, mesmo quando guiadas por valores compartilhados. Nesses casos, a formalização de funções e rotinas pode se sobrepor à espontaneidade da cultura missionária, criando tensão entre conformidade institucional e inspiração ideológica.
- Uma organização religiosa global, com presença em múltiplos países e unidades locais relativamente autônomas, pode adotar uma estrutura divisionalizada, mantendo uma instância central normativa (como um conselho doutrinário ou autoridade central) que orienta o conjunto.
Isso mostra que a estrutura missionária não exclui, mas interage com outras formas de organização. A missão pode ser o eixo de coesão cultural, enquanto a estrutura funcional adota características projetizadas, divisionalizadas ou mesmo mecanicistas, dependendo da necessidade de escala, controle ou replicação.
Por isso, ao analisar organizações com forte sentido de propósito — como ordens religiosas, ONGs, cooperativas ou movimentos sociais —, é importante distinguir entre o mecanismo de coordenação cultural (missão) e a estrutura formal de funcionamento. É essa combinação que define sua configuração organizacional real.
Estrutura política
A estrutura política, segundo Mintzberg, não é uma configuração deliberada de design organizacional, mas sim uma condição emergente que ocorre quando a estrutura formal é fraca, está em transição ou entra em colapso funcional. Nesse cenário, não há um mecanismo de coordenação predominante — o que impera são as disputas de poder, os conflitos internos e a ausência de consenso estrutural claro.
Essa configuração aparece em momentos de instabilidade, como processos de fusão ou aquisição (M&A), em organizações públicas com forte interferência externa ou em instituições com culturas altamente politizadas.
Coordenação: não há um mecanismo predominante
Características:
- Presença constante de conflitos e jogos de poder
- Ausência de consenso estável sobre papéis, prioridades e autoridade
- Disputas entre unidades, grupos de interesse ou lideranças
- Fragilidade da estrutura formal ou transição entre modelos
- Cultura marcada por “jogo político” e decisões baseadas em alianças ou pressões
Ambiente: incerto e fragmentado
Pontos positivos (limitados e contextuais):
- Pode permitir sobrevivência de múltiplos grupos em contextos caóticos
- Garante certo nível de adaptação política em ambientes altamente instáveis
- Permite protelação de decisões até maior clareza institucional
Pontos negativos:
- Baixa capacidade de implementação de decisões estruturadas
- Predomínio de interesses individuais ou departamentais sobre os organizacionais
- Perda de foco estratégico, desperdício de recursos e ineficiência
- Clima organizacional marcado por desconfiança, competição interna e paralisia decisória
Exemplos de contextos com estrutura política emergente:
- Organizações em processo de fusão, aquisição ou reestruturação: durante esse período, os papéis e lideranças ainda não estão definidos, gerando disputa por espaço e influência.
- Empresas públicas com forte interferência político-partidária: as decisões estruturais e operacionais podem ser constantemente reorientadas por pressões externas, enfraquecendo a governança.
- Universidades ou instituições com facções internas consolidadas: disputas entre departamentos, sindicatos, grupos acadêmicos ou ideológicos tornam a coordenação uma arena de negociação permanente.
- Empresas familiares em crise de sucessão ou sem governança clara: disputas entre herdeiros, executivos e conselheiros minam a capacidade decisória e corroem a estrutura.
Nota sobre o uso do termo “estrutura política”: Consideramos que o título “estrutura política”, consagrado por Mintzberg, não é mais apropriado, pois pode facilmente gerar confusão com organizações do sistema político formal, como partidos políticos. No entanto, é importante esclarecer que a estrutura política, nesse modelo, não se refere a partidos ou movimentos ideológicos, mas sim a um estado emergente e disfuncional da organização, em que nenhum mecanismo de coordenação predomina e as decisões passam a ser determinadas por disputas internas de poder. Partidos políticos organizados e coesos, por outro lado, geralmente operam como estruturas missionárias, orientadas por valores, doutrinas e objetivos coletivos. Apenas em situações de crise, fragmentação ou disputa interna intensa é que um partido poderia temporariamente assumir características de uma estrutura política — e, ainda assim, isso representaria uma disfunção e não um modelo deliberado de design. Com base nas características da estrutura política, segundo Mintzberg, sugerimos a seguir alguns títulos para denominar este tipo de estrutura (essas denominações são propostas nossas e não são embasadas na literatura):
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Forças que moldam a estrutura organizacional: entre dinâmica interna, contexto e escolha estratégica
O modelo de Mintzberg propõe que a estrutura organizacional não é resultado apenas de decisões formais ou modelos teóricos, mas sim de uma complexa interação entre forças internas, condições externas e escolhas estratégicas. Essas forças moldam, tensionam ou estabilizam a configuração estrutural de uma organização ao longo do tempo.
Este tópico explora, em quatro dimensões complementares, como essas forças se articulam:
- A essência da estrutura e os dilemas da descentralização revelam os movimentos internos entre as partes organizacionais;
- Os mecanismos de coordenação mostram como o trabalho é integrado de maneiras distintas;
- Os fatores contextuais explicam como características do ambiente, da tecnologia e da cultura influenciam o arranjo estrutural;
- E, por fim, a trajetória para uma configuração dominante sintetiza como essa dinâmica se traduz na adoção de uma forma estrutural prevalente.
Esses elementos oferecem uma lente analítica para entender por que diferentes organizações, mesmo atuando em contextos semelhantes, podem adotar estruturas distintas — e como essas estruturas evoluem ou se reconfiguram diante de novos desafios.
A essência da estrutura e o dilema da descentralização
A figura central do modelo de Mintzberg não representa apenas os componentes organizacionais, mas também as tensões estruturais fundamentais que definem a essência de qualquer organização. Em particular, ela explicita o dilema central entre centralização e descentralização, que atravessa toda a lógica do design organizacional.
A estrutura como campo de forças
Mais do que um organograma estático, Mintzberg enxerga a estrutura organizacional como um campo de forças em interação contínua.
As cinco partes da organização não são apenas blocos funcionais, mas atores com interesses, capacidades e papéis distintos, que puxam a organização em diferentes direções.
- A diretoria (topo estratégico) tende a concentrar o poder decisório e a buscar controle centralizado.
- A linha média pode atuar tanto como canal de transmissão quanto como foco de poder intermediário, buscando autonomia operacional.
- O núcleo operacional, por sua proximidade com a execução, também reivindica espaço decisório quando as tarefas exigem adaptação local.
- A tecnoestrutura exerce controle indireto ao padronizar processos, impor métodos e definir sistemas.
- O pessoal de apoio oferece serviços essenciais que, em alguns casos, se tornam estratégicos, tensionando sua posição na estrutura.
Essa dinâmica revela que o design organizacional não é apenas uma questão técnica, mas também uma negociação permanente entre forças centrípetas e centrífugas.
Centralização e descentralização como dimensões múltiplas
Mintzberg rejeita a ideia de que descentralização seja um atributo binário (existe ou não). Em vez disso, propõe quatro tipos principais de descentralização:
- Descentralização vertical – delegação de autoridade ao longo da hierarquia.
- Descentralização horizontal – ampliação da autonomia dos especialistas e analistas.
- Descentralização seletiva – delegação localizada a determinadas unidades ou funções.
- Descentralização paralela – descentralização ampla e simultânea em várias frentes.
Cada configuração estrutural combina essas dimensões de forma distinta. Por exemplo:
- A estrutura simples é fortemente centralizada, tanto vertical quanto horizontalmente.
- A adhocracia é descentralizada em todas as direções, com autonomia entre especialistas e entre equipes.
- A estrutura divisionalizada apresenta descentralização seletiva: as divisões têm autonomia, mas o centro corporativo mantém controle sobre resultados.
A descentralização como instrumento estratégico
A escolha entre centralização e descentralização não deve ser ideológica, mas contingente ao contexto e aos objetivos estratégicos. A descentralização pode:
- Aumentar a agilidade decisória e a capacidade de inovação.
- Aumentar a variabilidade e a complexidade da gestão.
- Reduzir o controle, mas aumentar o engajamento e a adaptação local.
É por isso que o modelo de Mintzberg é tão influente: ele não prescreve uma estrutura ideal, mas oferece uma ferramenta analítica poderosa para entender os dilemas do design organizacional — e, entre eles, a descentralização é um dos mais recorrentes e estratégicos.
Os mecanismos de coordenação
Para que as diferentes partes da organização funcionem de maneira integrada, é necessário coordenar o trabalho distribuído entre elas. Mintzberg propôs que todas as formas de estrutura organizacional se apoiam, em maior ou menor grau, em seis mecanismos fundamentais de coordenação. Cada um deles representa uma forma distinta de alinhar esforços e decisões dentro da organização.
Esses mecanismos não são mutuamente exclusivos, mas em cada configuração estrutural um deles tende a ser dominante, funcionando como o eixo central da coordenação.
- Ajuste mútuo: A coordenação ocorre por meio de comunicação informal direta entre as pessoas que realizam o trabalho. É o mecanismo mais simples e flexível, prevalecendo em organizações pequenas, equipes autônomas ou estruturas temporárias, como projetos exploratórios ou squads.
- Supervisão direta: Um indivíduo (gerente ou supervisor) coordena o trabalho de outros por meio de ordens ou orientações diretas. É o mecanismo clássico de estruturas hierárquicas, prevalecendo em organizações com forte centralização de autoridade, como estruturas simples ou modelos de comando e controle.
- Padronização dos processos: A coordenação ocorre quando os métodos e etapas do trabalho são previamente definidos. O foco está na uniformidade de procedimentos, sendo típica de burocracias mecanicistas. A tecnoestrutura exerce forte influência nesse tipo de coordenação.
- Padronização dos resultados: O que se padroniza são os objetivos ou metas a serem atingidos, e não os meios para alcançá-los. É comum em estruturas divisionalizadas ou baseadas em performance, nas quais diferentes unidades gozam de autonomia, desde que entreguem os resultados acordados.
- Padronização das habilidades: A coordenação é garantida pela formação técnica ou profissional prévia dos indivíduos. O trabalho é descentralizado, mas a integração é assegurada pelo compartilhamento de competências. É o mecanismo típico da burocracia profissional, como universidades e hospitais.
- Padronização das normas: A coordenação ocorre com base em valores, crenças e cultura organizacional compartilhada. É o mecanismo dominante nas estruturas missionárias, onde o alinhamento cultural substitui a supervisão formal.
A identificação do mecanismo de coordenação predominante é fundamental para entender por que certas estruturas são mais adequadas a determinados contextos. Por exemplo:
- A adhocracia se baseia no ajuste mútuo para lidar com alta incerteza e complexidade.
- A burocracia profissional depende da padronização das habilidades para garantir consistência.
- A estrutura divisionalizada opera por meio da padronização dos resultados, permitindo autonomia controlada.
Nos tópicos seguintes, veremos como esses mecanismos interagem com os fatores contextuais e com o grau de descentralização para formar as configurações estruturais propostas por Mintzberg.
Fatores contextuais que influenciam a estrutura
O modelo de Mintzberg organiza a estrutura organizacional com base em suas partes e nos mecanismos de coordenação, mas reconhece que a escolha da configuração estrutural mais adequada depende de fatores situacionais específicos. Esses fatores, também chamados de fatores de contingência, ajudam a explicar por que uma mesma estrutura pode funcionar bem em uma organização e falhar em outra.
Na flexM4i, adotamos o termo “fatores contextuais”, como você pode ver na seção introdutória “Fatores contextuais e tipos de inovação”. |
A seguir, são apresentados os principais fatores que influenciam a estrutura, segundo Mintzberg.
Idade e tamanho da organização
Organizações mais antigas e maiores tendem a apresentar:
- Maior formalização dos processos.
- Maior divisão do trabalho e especialização de funções.
- Mais níveis hierárquicos e áreas de apoio.
À medida que crescem, as organizações sentem necessidade de estruturar funções, criar regras e definir responsabilidades para manter a coordenação.
Sistema técnico (tecnologia de produção ou operação)
A tecnologia usada para realizar o trabalho influencia a estrutura. Mintzberg incorpora os achados de Joan Woodward e outros autores para destacar que:
- Tecnologias rotineiras e previsíveis favorecem estruturas mecanicistas e padronizadas.
- Tecnologias complexas e não repetitivas exigem maior flexibilidade, descentralização e comunicação informal — características da adhocracia.
Esse fator abrange não apenas o maquinário, mas também os sistemas de informação e automação.
O papel da tecnologia na estrutura organizacional após a transformação digital Desde a formulação do modelo de Mintzberg, o avanço das tecnologias digitais — especialmente a computação em nuvem, os sistemas ciberfísicos e, mais recentemente, a inteligência artificial — ampliou profundamente o papel do sistema técnico na definição da estrutura organizacional. Se antes a tecnologia era predominantemente rígida, física e previsível, hoje ela é inteligente, adaptável e distribuída, atuando não apenas como suporte à operação, mas como agente estruturante da organização. Em vez de simplesmente encaixar-se a uma estrutura, a tecnologia atual frequentemente redefine a própria lógica estrutural, abrindo espaço para formatos mais fluidos, distribuídos ou híbridos. Dois exemplos atuais:
Essas transformações mostram que o sistema técnico contemporâneo não pode mais ser compreendido apenas como um “fator de contingência”, mas como um motor ativo de configuração estrutural, que tanto habilita novos formatos organizacionais quanto desestabiliza estruturas tradicionais. |
Ambiente externo
O ambiente em que a organização opera influencia diretamente sua estrutura. Os principais aspectos são:
- Estabilidade vs. dinamismo: ambientes estáveis favorecem estruturas burocráticas; ambientes dinâmicos pedem estruturas mais adaptativas.
- Simplicidade vs. complexidade: ambientes simples permitem controle centralizado; ambientes complexos exigem descentralização e diversidade de respostas.
- Hostilidade: ambientes hostis (com escassez de recursos ou alta competição) tendem a provocar maior centralização e controle da diretoria.
Organizações que atuam em ambientes incertos e mutáveis precisam de estruturas mais orgânicas e capacidade de resposta rápida.
Poder e cultura organizacional
A estrutura também reflete as dinâmicas internas de poder e a cultura dominante na organização. Por exemplo:
- Organizações fortemente centradas na figura do fundador tendem à estrutura simples e centralizada.
- Culturas baseadas em autonomia e confiança podem sustentar estruturas mais descentralizadas.
- O estilo de liderança, os valores dominantes e os jogos políticos internos influenciam como a estrutura é desenhada — e como ela funciona na prática.
Estratégia organizacional
Embora não explicitado como fator isolado por Mintzberg nesse ponto, a estratégia adotada pela organização influencia a estrutura escolhida. A clássica ideia de que “a estrutura segue a estratégia” é compatível com o modelo: uma organização que opta por uma estratégia de inovação radical, por exemplo, tende a criar adhocracias ou unidades autônomas, enquanto estratégias de eficiência favorecem burocracias mecanicistas ou divisionalizadas.
Críticas e limitações do modelo de Mintzberg
Apesar de sua influência e aplicabilidade, o modelo de configurações estruturais de Mintzberg não está isento de críticas. Desde sua formulação original, o ambiente organizacional passou por transformações significativas — especialmente com o avanço das tecnologias digitais, a diversificação dos modelos de negócios e a emergência de novas formas de organização mais fluidas, distribuídas e híbridas. Nesse contexto, algumas limitações conceituais e práticas do modelo tornam-se mais evidentes.
Os principais pontos de crítica reconhecidos na literatura ou observados na prática organizacional são::
- Enfoque estruturalista: A ênfase do modelo nas estruturas formais, mecanismos de coordenação e partes organizacionais pode levar a uma visão excessivamente mecanicista da organização, em detrimento de aspectos como cultura, liderança emergente, dinâmicas informais, redes sociais internas e ecossistemas interorganizacionais.
- Aplicabilidade limitada a organizações híbridas e digitais: O modelo não contempla bem estruturas que combinam múltiplas lógicas simultâneas, como empresas que operam com núcleos industriais mecanicistas e, ao mesmo tempo, com hubs de inovação ágeis ou organizações com forte dependência de plataformas digitais, modelos em rede e coordenação algorítmica.
- Dificuldade de mapear estruturas emergentes: Configurações contemporâneas como organizações orientadas por propósito, plataformas organizacionais descentralizadas, DAOs (organizações autônomas distribuídas) ou estruturas em rede com governança distribuída não se encaixam claramente em nenhuma das sete configurações originais. O modelo também oferece pouca orientação para lidar com transições e hibridismos estruturais.
Trajetórias e flexibilização das configurações estruturais
Apesar das limitações apontadas no tópico anterior, o modelo de Mintzberg permanece relevante quando interpretado de forma flexível. Muitas das críticas podem ser atenuadas — ou mesmo resolvidas — ao se reconhecer que a estrutura organizacional não é fixa nem puramente normativa, mas o resultado de uma trajetória organizacional em constante adaptação.
Na prática, poucas organizações se encaixam perfeitamente em uma única configuração estrutural. Em vez disso, vivenciam movimentos de ajuste, combinação e transição, conforme mudam seu contexto, suas tecnologias, seus desafios estratégicos e suas capacidades internas.
Este tópico retoma e amplia os elementos centrais do modelo à luz dessa dinamicidade, mostrando como as organizações evoluem estruturalmente, por vezes de forma deliberada, por vezes emergente. O foco desloca-se da classificação estática para a compreensão da trajetória organizacional — um caminho de busca contínua por coerência estrutural e efetividade.
O modelo de Mintzberg apresenta sete configurações estruturais como tipos ideais. Na vida real, essas formas não surgem prontas ou por simples decisão de design. Elas são o resultado de uma trajetória moldada por forças internas e externas, restrições contextuais, mecanismos disponíveis de coordenação e escolhas estratégicas.
A estrutura organizacional, nesse sentido, não é apenas desenhada — ela emerge, estabiliza-se e, por vezes, é tensionada ou modificada em resposta a pressões internas (como disputas de poder ou crescimento funcional) e pressões externas (como ambiente, tecnologia e mercado).
Cada configuração estrutural é, portanto, o ponto de chegada de uma dinâmica organizacional que pode ser tanto deliberada quanto evolutiva.
Ao longo do tempo, a organização tende a se mover em direção à configuração estrutural que melhor acomoda suas características internas e seu contexto externo, conforme discutido nos fatores contingenciais. A diretoria, por exemplo, pode desejar implantar uma estrutura adhocrática para promover inovação, mas se o sistema técnico for padronizado e o núcleo operacional altamente especializado, a estrutura real pode se aproximar mais de uma burocracia profissional.
A predominância de um mecanismo de coordenação também ajuda a cristalizar a configuração resultante:
- Se prevalece a padronização dos processos, tende-se à burocracia mecanicista.
- Se a coordenação ocorre por ajuste mútuo, pode-se caminhar para a adhocracia.
- Se o controle se dá por metas e resultados, é comum surgir a forma divisionalizada.
Esse processo de consolidação estrutural não é neutro nem permanente. Mudanças na estratégia, na tecnologia, no ambiente institucional ou mesmo nos valores organizacionais podem forçar uma reconfiguração. Do mesmo modo, é comum observar híbridos estruturais, com coexistência de múltiplas lógicas (por exemplo, uma empresa com núcleo operacional mecanicista e áreas de inovação adhocráticas).
Por fim, vale destacar que a trajetória para uma configuração dominante não é necessariamente linear:
- Pode haver oscilação entre formas, como em empresas que alternam centralização e autonomia conforme o ciclo de vida do negócio.
- Pode haver zonas de instabilidade, como nas estruturas políticas ou em organizações em transição.
- E pode haver modelos deliberadamente compostos, como estruturas ambidestras que combinam exploração e eficiência em diferentes unidades.
Compreender essa trajetória — mais do que apenas classificar a estrutura atual — é essencial para alinhar a arquitetura organizacional com a estratégia, os desafios e o momento vivido pela organização.
Implicações para a gestão da inovação
A estrutura organizacional influencia profundamente como a inovação acontece: quem decide, quem executa, como se aprende e como se escala. Cada configuração proposta por Mintzberg oferece oportunidades e impõe limites à gestão da inovação — seja incremental ou radical, seja exploratória ou voltada à melhoria contínua. Este tópico apresenta os principais efeitos estruturais sobre a inovação e introduz o conceito de ambidestria organizacional como uma resposta aos desafios enfrentados por grandes empresas.
Relações entre as configurações estruturais e os tipos de inovação
As diferentes configurações estruturais propostas por Mintzberg oferecem condições distintas para a gestão da inovação. A seguir, sintetizamos os tipos de inovação que cada estrutura tende a favorecer — e os limites que impõem.
- Estrutura simples: favorece a inovação ágil e de oportunidade, comum em empreendimentos liderados por fundadores com forte autonomia decisória. É típica de startups nas fases iniciais, que exploram nichos desconsiderados por grandes empresas e, em alguns casos, originam inovações radicais ou disruptivas. Seu ponto fraco está na informalidade, que dificulta a consolidação de processos e o crescimento estruturado..
- Burocracia mecanicista: ideal para inovações incrementais voltadas à eficiência. A ênfase na padronização e no controle reduz a flexibilidade, tornando difícil a adaptação a mudanças rápidas ou disruptivas.
- Burocracia profissional: fomenta inovações baseadas em expertise, como em hospitais e universidades. Apesar de permitir autonomia técnica, pode apresentar barreiras à inovação sistêmica ou ao trabalho multidisciplinar.
- Estrutura divisionalizada: permite inovação incremental com autonomia local. As divisões respondem por seus resultados, o que incentiva soluções adaptadas ao mercado. No entanto, a inovação pode se limitar a variações táticas, com pouca cooperação entre divisões.
- Adhocracia: desenhada para inovação exploratória e radical. Estimula equipes multidisciplinares, prototipação e aprendizado em ciclos curtos. Sua fragilidade está na dificuldade de coordenação, institucionalização e escalabilidade.
- Estrutura missionária: impulsiona a inovação orientada por propósito. A cultura forte favorece a coesão e compromisso, mas pode tornar a organização resistente a mudanças que desafiem seus valores.
- Estrutura política: em contextos de disputa ou indefinição, a inovação tende a ser fragmentada ou paralisada. A ausência de coordenação e direção estratégica mina a capacidade de gerar ou escalar soluções.
Limites da adhocracia na gestão da inovação radical
A adhocracia é amplamente reconhecida por favorecer a inovação radical, mas sua adoção como estrutura principal traz limitações importantes. A seguir, destacamos os principais desafios que surgem quando essa configuração não é combinada com outras formas organizacionais.
- Dificuldade de sustentação prolongada: estruturas adhocráticas, por definição, operam em fluxo constante — ou seja, com equipes que se formam, se dissolvem e se reorganizam conforme os desafios. Essa fluidez favorece ideias inovadoras, mas também gera fragilidade na hora de consolidar, integrar ou escalar o que foi criado.
- Sobrecarga gerencial: o ajuste mútuo como mecanismo de coordenação exige interação constante entre equipes e líderes. À medida que os projetos crescem, esse modelo se torna menos eficiente e mais propenso a ruídos.
- Dependência de alinhamento lateral: a ausência de processos formais e estruturas claras dificulta o acoplamento entre a unidade inovadora e o restante da organização, resultando em iniciativas que não geram transformação sistêmica.
- Risco de dispersão estratégica: sem mecanismos de integração com a estratégia corporativa, projetos inovadores podem proliferar sem foco, consumindo recursos e gerando resultados pontuais, mas não duradouros.
A adhocracia tem papel fundamental na geração de inovação disruptiva, mas precisa ser articulada a outras estruturas organizacionais. Em empresas maiores, isso exige governança clara, conexões estruturais e caminhos de escalonamento. |
Ambidestria organizacional e combinações estruturais para inovar com consistência
Grandes organizações raramente conseguem sustentar a inovação apenas com uma estrutura única. A ambidestria organizacional surge como resposta à necessidade de combinar espaços voltados à exploração de inovações mais radicais com estruturas orientadas à eficiência. Este subtópico destaca essa combinação e remete à seção dedicada ao tema na flexM4i.
- Necessidade de explorar e aprimorar ao mesmo tempo: empresas maduras enfrentam o desafio de inovar radicalmente sem comprometer a eficiência de suas operações principais. Isso exige estruturas ambidestras — que combinem espaços de experimentação com mecanismos de estabilidade.
- Combinação entre configurações: muitas organizações adotam adhocracias para projetos de inovação radical (H3) enquanto mantêm estruturas mecanicistas ou divisionais para a operação regular (H1). Isso implica coexistência entre lógicas diferentes, com tensões produtivas e mecanismos de mediação.
- Modelos estruturais ambidestros: incluem separação estrutural (unidades independentes para exploração), integração seletiva (equipes mistas, como squads) ou abordagens contextuais (autonomia variável conforme o desafio). Cada uma exige níveis distintos de coordenação e alinhamento estratégico.
- Condições para a ambidestria funcionar: além do desenho estrutural, a ambidestria exige liderança engajada, cultura de aprendizado, metas diferenciadas por horizonte de inovação e mecanismos de absorção de resultados exploratórios.
Este conteúdo se articula com a seção Ambidestria Organizacional, que aprofunda os modelos, mecanismos e práticas para equilibrar eficiência e exploração em diferentes contextos organizacionais.
Leituras complementares para aprofundamento
Este tópico é voltado a pessoas interessadas no nível de detalhamento avançado.
Esta seção da flexM4i apresentou a proposta estrutural de Mintzberg com foco em sua aplicação prática à gestão da inovação. Para leitores interessados em aprofundar o embasamento conceitual que influenciou essa abordagem, vale conhecer dois trabalhos clássicos que ajudaram a moldar o pensamento estruturalista nas organizações. A seguir, uma breve síntese desses modelos.
Burns & Stalker (1961) – Sistemas mecanicistas e orgânicos:
A partir de um estudo sobre indústrias britânicas enfrentando mudanças tecnológicas, os autores propuseram dois sistemas organizacionais contrastantes.
- O sistema mecanicista que se caracteriza por hierarquias rígidas, divisão de trabalho clara e autoridade centralizada, sendo eficaz em ambientes estáveis.
- O sistema orgânico que favorece comunicação informal, flexibilidade de papéis e descentralização, sendo mais adequado a contextos de mudança.
Essa dualidade antecipou discussões que Mintzberg mais tarde traduziu em categorias estruturais como a burocracia mecanicista e a adhocracia.
Lawrence & Lorsch (1967) – Diferenciação e integração:
O modelo de Lawrence e Lorsch é construído a partir de estudos empíricos em três setores industriais — plásticos, alimentos e recipientes — e busca compreender como organizações podem se estruturar de forma eficaz em ambientes com diferentes níveis de incerteza.
A proposta parte da ideia de que diferentes partes da organização interagem com diferentes partes do ambiente, que variam em grau de previsibilidade e complexidade. Por isso, essas unidades precisam apresentar níveis distintos de diferenciação — ou seja, desenvolver formas específicas de pensamento, comportamento, linguagem e processos internos adaptadas às exigências ambientais que enfrentam.
No entanto, essa diferenciação torna a integração mais desafiadora: quanto mais especializadas e distintas forem as unidades, maior será a necessidade de mecanismos de integração eficazes, como estruturas hierárquicas, regras, planos ou papéis de ligação entre grupos.
O modelo enfatiza, portanto, a coexistência de dois imperativos organizacionais: adaptar-se a diferentes ambientes por meio da diferenciação e manter a coesão por meio da integração. Além disso, inclui a variável da administração de conflitos intergrupais, apontando que a capacidade de resolver tensões internas depende de padrões de influência baseados em conhecimento e competência, e não apenas em autoridade formal. Essa formulação ajuda a compreender os desafios de organizações que operam em ambientes diversos e complexos, e fornece uma base importante para reflexões posteriores sobre estruturas híbridas, governança matricial e ambidestria organizacional.
Essas referências não são tratadas em profundidade na flexM4i, mas oferecem um pano de fundo valioso para quem deseja compreender as raízes e desdobramentos teóricos das configurações organizacionais apresentadas ao longo desta seção. |
Utilizamos fontes secundárias para descrever esses dois clássicos
Não tivemos acesso direto às publicações originais de Burns & Stalker (1961) e Lawrence & Lorsch (1967).
A descrição de Burns & Stalker (1961) foi extraída de Sine, Mitsuhashi & Kirsch (2006) – Revisiting Burns and Stalker: Formal Structure and New Venture Performance in Emerging Economic Sectors.
Este artigo examina criticamente a proposição central de Burns & Stalker — de que estruturas orgânicas são mais eficazes em ambientes turbulentos — aplicando-a a startups da era da internet. Os autores demonstram que, ao contrário da teoria clássica, novos empreendimentos em setores emergentes se beneficiam de maior formalização, especialização e intensidade administrativa, especialmente para superar a “liability of newness”. Assim, o estudo revela os limites da aplicabilidade direta do modelo de Burns & Stalker a organizações nascentes.
A descrição de Lawrence & Lorsch (1967) foi baseada em uma publicação dos mesmos autores de 1986 (edição em português), na qual eles explicam o que foi a proposta no livro original.
Recomendamos também a leitura de Tosi, Aldag & Storey (1973) – On the Measurement of the Environment: An Assessment of the Lawrence and Lorsch Environmental Uncertainty Subscale.
Este artigo avalia criticamente a escala desenvolvida por Lawrence & Lorsch para medir incerteza ambiental, apontando problemas metodológicos na consistência interna e validade das medidas. No entanto, também reforça o princípio central do modelo — de que a eficácia organizacional requer o equilíbrio entre diferenciação e integração em função das características ambientais. Os autores contextualizam essa ideia no campo mais amplo da teoria da contingência e discutem implicações para pesquisa futura.
Esses artigos fornecem uma base secundária sólida para compreender as ideias centrais dos modelos clássicos de estrutura organizacional, mesmo na ausência dos livros originais.
Procedimentos e apoio do chatGPT
Foi utilizada a versão mais recente do ChatGPT-4o, com funcionalidades aprimoradas de análise e geração textual.
Procedimento antes da iteração com o ChatGPT
Antes de iniciar a interação com o ChatGPT, o autor já havia estudado o modelo de Mintzberg em profundidade e utilizado esse conhecimento em diferentes apresentações e materiais internos. Também foram recuperados conteúdos já existentes na flexM4i e slides elaborados previamente, incluindo versões de figuras explicativas produzidas pelo autor. Essa preparação inicial forneceu a base conceitual e visual para o início da seção.
Trabalho interativo com o ChatGPT
A criação desta seção teve a duração de mais de 20 horas, com 129 interações “ser humano – máquina (ChatGPT)”, realizadas ao longo de três dias. A conversa resultou em mais de 170 páginas de interação e cerca de 39 mil palavras geradas. A extensão do conteúdo deveu-se, em grande parte, à necessidade de construir, revisar e ajustar cada trecho da seção em um nível de detalhamento elevado, com foco em clareza conceitual, profundidade teórica e adequação prática.
Durante a confecção da seção, foram utilizados trechos de livros e artigos clássicos (como o livro original de Mintzberg, além de textos de Burns & Stalker e Lawrence & Lorsch),. Em alguns momentos, o autor compartilhou trechos digitalizados dessas obras para garantir que o ChatGPT pudesse propor conteúdos consistentes com a bibliografia de referência.
Após definir uma primeira versão do sumário da seção, foi iniciada a edição conjunta “ser humano – máquina” de cada tópico. Ao longo do desenvolvimento, o sumário foi refinado em múltiplas rodadas até atingir uma estrutura final modular, com tópicos organizados em subtópicos curtos, compatíveis com o modelo de microlearning da flexM4i.
Em nenhum momento o autor solicitou que o ChatGPT gerasse respostas com base em conhecimento geral. Todo o conteúdo foi elaborado a partir de materiais fornecidos, trechos comentados ou instruções precisas baseadas em análises do autor. Os textos produzidos passaram por diversas iterações, com o autor sugerindo ajustes, criticando formulações e, ao final, realizando pessoalmente a edição final de todos os blocos de conteúdo.
O autor conferiu sempre se as afirmações do ChatGPT estavam de acordo com as obras originais. Quando surgiam inconsistências ou dúvidas, ele fazia a checagem diretamente nas publicações de referência antes de aprovar qualquer trecho.
Esse processo exigiu iterações intensas e repetitivas, com refinamento textual, ajustes conceituais e reorganização de argumentos. Em vários momentos, versões intermediárias foram reanalisadas no próprio ChatGPT, que indicava melhorias, tensionamentos ou oportunidades de aprofundamento. O autor avaliava criticamente essas sugestões, nem sempre concordando, e frequentemente propunha soluções alternativas, mantendo sempre o controle final da redação.
Foi solicitado ao ChatGPT que não aceitasse automaticamente as propostas do autor, mas que reagisse com análise crítica, sugerisse alternativas e propusesse reformulações embasadas nos conteúdos utilizados. Quando aplicável, o autor indicava práticas baseadas em sua própria experiência, e o ChatGPT as incorporava, respeitando a distinção entre conteúdo empírico e referenciado.
Além dos textos, esta seção também contou com a criação de figuras vetoriais personalizadas para representar as sete configurações estruturais do modelo de Mintzberg. O autor fornecia esboços ou imagens de referência, e o ChatGPT criava versões estilizadas, com cores distintas e traços padronizados para garantir coerência visual entre as figuras.
A seção foi concluída com a adição de um tópico avançado final com referências aos autores clássicos (Burns & Stalker, Lawrence & Lorsch), a partir de artigos selecionados.
Durante todo o processo, foi enfatizado que o ChatGPT não deveria reescrever blocos inteiros automaticamente, mas sim identificar pontos de melhoria e sugerir correções localizadas, com justificativas. A edição final foi sempre realizada manualmente pelo autor da flexM4i.
Referências
Burns, T., & Stalker, G. M. (1961). The Management of Innovation. London: Tavistock Publications.
Galbraith, J. R. (2014). Designing organizations: Strategy, structure, and process at the business unit and enterprise levels. John Wiley & Sons.
Hill, G. M. (2013). The Complete Project Management Office Handbook (3rd ed.). CRC Press.
Lawrence, P. R., & Lorsch, J. W. (1967). Organization and Environment: Managing Differentiation and Integration. Boston: Harvard Business School Press.
Lawrence, P. R., & Lorsch, J. W. (1986). Desenvolvendo organizações: diagnóstico e ação (C. Knipel, Trans.). São Paulo: Atlas.
Mintzberg, H. (1979). The structuring of organizations. Engle-wood Cliffs. J: Prentice-Hall
Mintzberg, H. (2017). Para entender as organizações… finalmente! Rio de Janeiro: Bookman.
Sine, W. D., Mitsuhashi, H., & Kirsch, D. A. (2006). Revisiting Burns and Stalker: Formal Structure and New Venture Performance in Emerging Economic Sectors. Academy of Management Journal, 49(1), 121–132.
Tosi, H., Aldag, R., & Storey, R. (1973). On the Measurement of the Environment: An Assessment of the Lawrence and Lorsch Environmental Uncertainty Subscale. Administrative Science Quarterly, 18(1), 27–36.