Gestão de portfólio

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Autoria: Solon  Yukio Shibata (yukioshibata@usp.br)  e Henrique Rozenfeld (roz@usp.br) 

Gestão do portfólio é o processo de gestão integrada de todos os programas e projetos de uma organização (o portfólio) para alcançar os seus objetivos estratégicos

Esta seção ainda está em edição / desenvolvimento

Abordagem versus Metodologias e Processos

Consideramos a gestão de portfólio uma abordagem, pois ela é constituída por um conjunto de princípios e práticas que utilizamos para lidar com um problema ou situação.

A abordagem de gestão de portfólio pode ser desdobrada em várias metodologias e/ou processos de gestão de portfólio, que adotam os princípios, mas indicam sequências distintas de atividades dado o contexto da organização (práticas já adotadas, objetivos da organização, cultura atual, etc).

De acordo com a terminologia adotada na flexM4I, diferenciamos metodologia de processo.

Uma metodologia instanciada e formalizada em uma empresa torna-se um processo específico dessa empresa.

No entanto, consideramos na flexM4I metodologias e processos como equivalentes.

As metodologias e/ou processos de gestão de portfólio serão publicados na seção “ práticas de inovação” (em desenvolvimento). Esta seção discute somente a abordagem “gestão de portfólio”.

Definições

Gestão do portfólio é o processo de gerenciamento do conjunto de todos os programas e projetos de uma organização (o portfólio) para alcançar os seus objetivos estratégicos (PMI, 2013).

Segundo Cooper (2017):

  • a gestão de portfólio de projetos é um processo de decisão dinâmico, por meio do qual a lista de projetos de inovação ativos de uma empresa é constantemente atualizada e revisada.
  • nesse processo, novos projetos de inovação são avaliados, selecionados e priorizados.
  • os projetos existentes podem ser acelerados, eliminados ou não priorizados.
  • os recursos são alocados e realocados para os projetos ativos.

A partir desta definição, podemos destacar de maneira geral as atividades relacionadas à gestão de portfólio de projetos:

  • Planejamento do portfólio;
  • Execução do portfólio;
  • Monitoramento e controle do portfólio.

Entraremos em mais detalhes sobre cada uma das atividades posteriormente.

O processo de decisão do portfólio é caracterizado por:

  • informações incertas e variáveis,
  • oportunidades dinâmicas,
  • objetivos múltiplos,
  • considerações estratégicas,
  • interdependência entre projetos e
  • vários tomadores de decisão e locais.

Segundo o PMI (2017), do ponto de vista organizacional:

  • a gestão de programas e projetos foca em fazer programas e projetos da maneira “certa”; e
  • a gestão de portfólios foca em fazer os programas e projetos “certos”.

Objetivos e benefícios da gestão de portfólio

Vimos que inovar é sair da situação atual para atingir uma situação futura, cujo resultado prove valor  aos stakeholders devem perceber valor na inovação. Listamos também nesse tópico como cada stakeholder percebe valor de forma diferente.

Como o portfólio de inovações é o conjunto de todas as iniciativas inovadoras, obviamente a gestão de portfólio tem como objetivo primário entregar valor para os stakeholders, que geralmente implica em trade-offs.

Por exemplo, o trade-off mais tradicional é entre qualidade e custo. Devemos ter ofertas com qualidade elevada e custo deve ser o mais baixo possível para garantir margens de lucratividade. Outro trade-off seria entre as expectativas dos acionistas em obter margens de lucro e as expectativas da sociedade em que a oferta da empresa não cause nenhum impacto ambiental e social. Esses trade-offs relacionam-se principalmente com as ofertas individuais, mas compõem um portfólio e por isso devem também ser consideradas quando tratamos da gestão de portfólio.

Normalmente, a literatura sobre gestão de portfólio não cita esse “objetivo primário”, mas o inclui em uma lista de objetivos da gestão de portfólio.

O livro clássico de gestão de portfólio para novos produtos, publicado em 1998 e atualizado em 2001, apresenta os seguintes objetivos principais da gestão de portfólio (Cooper et al., 2001):

  • maximizar o valor do portfólio: apesar de parecer que se trata somente do retorno financeiro, este objetivo considera os riscos associados, devido ao método que ele propõe: valor comercial esperado, que é uma árvore de decisão que calcula este valor a partir do VPL (valor presente líquido) considerando a probabilidade de sucesso comercial e probabilidade de sucesso técnico. O valor resultante não é um valor esperado (apesar do nome), mas serve para comparar entre alternativas (veja o quadro a seguir). Veja que este objetivo pode ser considerado como uma possibilidade do “objetivo primário” citado anteriormente.
  • alinhar o portfólio com as estratégias: os projetos precisam refletir as estratégias e nenhuma deve ser negligenciada. Aqui é importante encontrar um equilíbrio entre as estratégias definidas de forma top-down e bottom-up (leia o tópico “metodologias de execução de estratégias”)
  • balancear o portfólio: de acordo com os diferentes tipos de projetos e critérios. Balancemento entre projetos de curto e longo prazo; baixo risco ou risco elevado; mercados diferentes; tecnologias; categorias de produtos; tipos de projetos (produtos, serviços, melhorias, excelência operacional – redução de custo e produtividade; P&D etc.)
  • selecionar projetos dentro da capacidade de desenvolvimento:  a maior parte das empresas coloca em seu portfólio mais projetos do que a sua capacidade de desenvolvimento, ou seja, mais do que os recursos disponíveis (Cooper et al., 2000). Como resultado, essas empresas não conseguem lançar suas ofertas a tempo ou queimam etapas importantes para acelerar seus projetos. Veja que a falta de capacidade é crucial nas fases de detalhamento, que normalmente são demoradas. É um dos motivos para a aplicação da abordagem de open innovation. Conseguir dimensionar e analisar a capacidade existente e necessária é uma das formas para se atingir este objetivo.

 

Lógica do valor comercial esperado e maximização do valor auxiliam a inovação?

  • Como decidir entre um projeto que vai dar retorno pequeno com certeza e outro que pode dar um retorno mas existem muitas incertezas? 
  • Esse sempre foi um trade-off tradicional.
  • Foi buscando sempre “retornos certeiros” que as empresas deixaram de realizar inovações radicais.
  • No mundo tradicional de negócios, o sucesso da inovação é baseado em uma análise de mercado, quando se escolhe os segmentos de maior valor esperado. É a lógica do mantra “escolher a estratégia que leve à maximização dos retornos”. Só que o conceito de valor é mais amplo;
  • Empreendedores experientes viram essa lógica de ponta cabeça – eles pensam em termos de perdas toleráveis ao invés de retornos esperados.  Eles procuram então parceiros para arriscarem juntos. E isso não depende do empreendimento, mas das características pessoais;
  • Empreendedores abraçam uma oportunidade, realizam – constroem MVPs, falham o mais rapidamente possível, geram novas opções futuras e usam todo esse aprendizado em uma próxima iteração da oportunidade (pivotar);
  • As receitas de inovações são difíceis de avaliar antecipadamente. O quanto o empreendedor (pessoa) vai investir (não somente em termos financeiros) pode ser estimado e a tolerância a perder esse investimento é uma questão pessoal; 

Por isso é que o objetivo de maximização de valor nos projetos exploratórios não deveria focar em receitas e sim nos benefícios (valor). No caso das startups, o foco principal para a geração de valor é no cliente. Em empresas estabelecidas, é importante se entender todos os stakeholders a quem precisamos gerar estes benefícios e definir a estratégia a partir disto.

Como implementar um espírito de intraempreendedorismo em empresas estabelecidas para conseguir trabalhar assim? Somente com uma abordagem de gestão da inovação que trata de forma orquestrada todas as perspectivas da empresa e seu ecossistema.

Segundo o PMI (2017), os objetivos da gestão de portfólio são:

  •  Orientar as decisões de investimento organizacional.
  •  Selecionar a combinação ideal de programas e projetos para cumprir os objetivos estratégicos (*: semelhante ao “alinhar o portfólio com as estratégias).
  •  Fornecer transparência na tomada de decisão.
  •  Priorizar a alocação de equipe e recursos físicos.
  •  Aumentar a probabilidade de alcançar o retorno desejado sobre o investimento (*: semelhante ao maximizar o valor do portfólio).
  •  Centralizar o gerenciamento do perfil de risco agregado de todos os componentes.

Mas na verdade, uma análise desses “objetivos”, quando comparados com os objetivos colocados anteriormente, mostra que estes são mais tácitos e representam ações para se atingir os objetivos anteriores, a menos dos objetivos marcados com (*), que são semelhantes aos objetivos anteriores.

Esses objetivos determinam métodos de gestão de portfólio e critérios para seleção e priorização.

No entanto, nas fases iniciais da inovação, quando se trata de projetos exploratórios, não se consegue definir critérios precisos para atingir a maximização de valor do portfólio. Não existem informações confiáveis para se calcular retornos financeiros e as probabilidades de sucesso comercial e técnico. Voltamos novamente ao assunto do “cuidado com a gestão de portfólio” do tópico anterior, ou seja, primeiro devemos comprovar as hipóteses de valor e de mercado para depois evoluir e obter informações que viabilizem a aplicação de critérios quantitativos.

Origem e abrangência

Gestão do portfólio é um conceito que surgiu no mundo financeiro usado para alocar dinheiro entre ativos financeiros, tais como ações de empresas, moedas, câmbio, títulos públicos e privados, commodities e outros.

Em marketing é comum usar o termo gestão de portfólio de produtos, associado ao planejamento do produto, que inclui o monitoramento e avaliação do desempenho dos produtos e serviços no mercado, identificação de oportunidades, o que incluir no catálogo de ofertas, o que tirar do mercado, ou seja, como realizar continuamente a revisão das suas ofertas e a atualização, via inovação é claro. A próxima figura ilustra que o portfólio de produtos surge depois dos processos de inovação.

Figura 557: ilustração de um portfólio de produtos após os processos de inovação

Nas áreas de engenharia aplicada, administração e negócios, utiliza-se a gestão de portfólio de projetos. Ou seja, também associado com inovações. E o que são projetos? Confira no nosso glossário a definição mais difundida.

Um esforço temporário empreendido para criar um produto, serviço ou resultado exclusivo.
A natureza temporária dos projetos indica que o (trabalho do) projeto possui um início e um fim.
Os projetos podem ser independentes ou fazer parte de um programa ou portfólio. (PMI, 2021).

O maior investimento das empresas está nos projetos de desenvolvimento de tecnologias, produtos e serviços, que podem abranger as fases de detalhamento e implementação de uma ideia aprovada em um projeto exploratório. A maior parte das publicações em inovação trata da gestão do portfólio desse tipo de projeto.  A próxima figura completa a anterior, ilustrando um “posicionamento” desses portfólios em relação ao portfólio de produtos e serviços, que já estão no mercado.

Figura 558: ilustração do posicionamento “no tempo” dos portfólios de projetos exploratórios e de desenvolvimento de tecnologia, produtos e serviços com relação ao portfólio de produtos e serviços, que já estão no mercado 

Veja que a figura também destaca na fase inicial, um portfólio de projetos exploratórios. Eles não devem ser tratados na mesma forma que os projetos de desenvolvimento, como mostrado no próximo tópico “Cuidado com a gestão de portfólio”

Se você está incomodado com a representação de um funil (filtro), leia “Funil de inovação ainda é válido?

Na flexM4I, inovação vai além de produtos e serviços, pois são vários os possíveis objetos de inovação, que incluem mudanças da empresa para atingir um novo nível de capabilidade. Recorde os objetos de inovação (consistentes com a visão sistêmica da empresa e seu ecossistema) no tópico “tipos de inovação”. Além disso, a inovação inicia muito antes da definição de um projeto, começa no planejamento estratégico, passa pela gestão de ideias fomentadas pelo intraempreendedorismo e abrange o tratamento de oportunidade, problemas, dores, desafios e pedidos (no caso de inovações sob encomenda). Assim, a próxima figura ilustra a abrangência de um possível portfólio de inovações.

Figura 559: ilustração de um portfólio de inovação

Lembre que o termo inovação representa uma ação e o resultado dessa ação.

Componentes de um portfólio

No contexto da gestão de portfólio, “componentes” é um termo genérico que se utiliza para indicar os ativos, ofertas (produtos ou serviços), projetos ou programas, que serão o objeto da gestão.

A gestão de portfólio na inovação trata principalmente de projetos e programas de inovação.

Quando falamos sobre componentes da gestão de portfólio de projetos, estamos nos referindo a todas as iniciativas que suportam a organização a alcançar seus objetivos estratégicos (e no caso da gestão de portfólio de inovação, eles refletirão a estratégia de inovação diretamente). 

Podem ser considerados componentes de um portfólio de projetos (PMI, 2017):

  • Projetos: esforços temporários empreendidos para criar um produto, serviço ou resultado único (ver definição no nosso glossário);
  • Programas: coleções de projetos e atividades relacionadas que são geridos de maneira coordenada de modo a se extrair benefícios que não seriam possíveis se geridos individualmente;
  • Portfólios: coleções de programas, projetos, e suas operações, geridos como grupo para alcançar objetivos estratégicos. Neste caso, estamos considerando que existem vários portfólios dentro do sistema de portfólios da empresa. Falaremos disso a seguir.

Abaixo você pode ver uma figura que ilustra uma visão tradicional de um portfólio de programas e projetos.

Figura 556: visão tradicional de um portfólio de programas e projetos

Uma empresa pode gerenciar mais de um portfólio no seu sistema de entrega de valor (PMI, 2021). É importante relembrarmos que, dentro da mesma organização, podem existir diversos portfólios que contemplam os diferentes tipos de projetos, sejam eles de inovação, sejam produtos ou serviços. Cada componente pertencerá a uma hierarquia com seus objetivos específicos, definidos a partir da estratégia organizacional, e assim, teremos o sistema de portfólios da empresa. Tais componentes estarão relacionados a um ou mais objetivos estratégicos, e também estarão interrelacionados.

O papel do gestor de portfólio de projetos é maximizar a entrega de valor através dos resultados a serem obtidos por cada portfólio, que por sua vez é a soma dos resultados e interações entre seus componentes e as funções de negócio.

 Além dos três componentes que citamos acima, também podemos considerar as atividades da operação como sendo parte também do portfólio, ou seja, ações necessárias para se realizar as atividades da gestão do portfólio, e execução dos projetos e programas e atingimento dos objetivos estratégicos, contendo eles ou não. 

Neste ponto, vale lembrarmos a diferença entre um projeto e operação. Assim como já falamos anteriormente, um projeto é um esforço temporário empreendido para alcançar um resultado único.

Vamos utilizar aqui a definição de operação do PMI (2008):

Operação é uma função organizacional que realiza a execução de atividades que produzem um produto ou fornecem um serviço repetitivo.

Na figura a seguir, podemos ver um sistema de entrega de valor com dois portfólios (formados por programas e projetos), assim como um programa que não está associado a nenhum portfólio, e projetos que não estão associados a nenhum programa, e nenhum portfólio. Todos eles são suportados por atividades operacionais assim como processos da cadeia de suprimentos, recursos humanos, etc, e se tornam parte essencial da entrega de valor e, logo, atingimento dos objetivos estratégicos. Dessa forma, fica mais claro de entendermos como as atividades operacionais influenciam diretamente como parte da gestão de portfólio, da mesma forma que os projetos e programas também se influenciam.

Uma das grandes dores nas empresas é a falta de visão estratégica sobre os projetos que estão sendo e que serão executados, gerando investimentos mal planejados, e priorizações que não necessariamente refletem a estratégia da empresa. Agrupar os componentes e gerí-los como parte de um portfólio levando em consideração seus objetivos (listados na seção seguinte) é uma das formas de aumentar a eficácia da governança e da gestão de todo o trabalho empreendido em cada componente, ajudando a concretizar as estratégias e prioridades organizacionais. Isto é o que chamamos de visão do portfólio. Ela nos permite enxergar de que forma os objetivos estratégicos estão refletidos no sistema de portfólios, assim como se estamos aplicando e coordenando corretamente a governança adequada de modo a permitir a alocação autorizada de recursos humanos, financeiros e físicos com base no desempenho e benefícios esperados. (PMI, 2017).

 

 

Referências

Cooper, R. G., Edgett, S. J., & Kleinschmidt, E. J. (2000). New problems, new solutions: making portfolio management more effective. Research Technology Management, 43(2), 18–33. https://doi.org/10.1080/08956308.2000.11671338

Cooper, R. G.; Edgett, S. J.; Kleinschmidt, E. J. (2001). Portfolio management for new products. Cambridge, Massachusetts: Perseus Books, 2ed.

Cooper, R. G. (2017). Winning at new products: Creating value through innovation. Basic Books.

PMI (2013). PMBoK – Guide to the project Management body of knowledge. 5th. ed. Pennsylvania: Project Management Institute, Inc., Newtown Square,PA.

PMI. PMBoK (2017) – Guide to the project Management body of knowledge. 6th. ed. Pennsylvania: Project Management Institute, Inc.

PMI (2021). PMBoK – Guide to the project Management body of knowledge. 7th. ed. Pennsylvania: Project Management Institute, Inc.

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