Governança da inovação
Relação com a governança corporativa, papéis e modelosflexM4I > abordagens e práticas > Governança da inovação – Relação com a governança corporativa, papéis e modelo (versão 1.0
Autoria: Henrique Rozenfeld ([email protected]) com apoio do chatGPT (leia mais).
Introdução
A governança da inovação não opera isoladamente. Ela deve ser entendida como um desdobramento da governança corporativa, conectando-se diretamente às decisões estratégicas da organização e à atuação de seus agentes formais — como o conselho de administração e a alta direção (CEO e a diretoria).
Compreender essa relação é essencial para garantir legitimidade, alinhamento estratégico e efetividade às decisões sobre inovação.Nesta seção, mostramos como a governança da inovação deriva dos princípios e estruturas da governança corporativa, quais responsabilidades são atribuídas a cada instância decisória e de que forma esses papéis se complementam.
Também analisamos diferentes modelos de governança da inovação, abordando critérios para sua escolha, combinações possíveis e fatores que afetam sua efetividade, incluindo resultados de pesquisas sobre sua aplicação prática.
Ao longo da seção, aprofundamos a discussão sobre o papel do conselho e da alta direção (CEO e diretoria), destacando a atuação do comitê de inovação. Por fim, conectamos as decisões de governança ao processo mais amplo de design organizacional, que estrutura a arquitetura da organização voltada à inovação.
Esta é a segunda seção de uma série de cinco sobre governança da inovação. A seção principal sobre governança da inovação apresenta os fundamentos e motivos para adoção dessa abordagem, além de relativizar a aplicação da governança para não limitar a criatividade e agilidade. Abrindo o próximo tópico você poderá conhecer as seções da governança da inovação e outras seções relacionadas. |
Seções da flexM4i relacionadas com a governança da inovação
A figura abaixo mostra no centro as cinco seções relacionadas com a governança da inovação e em volta outras seções que podem contribuir para o estabelecimento dessa governança.
Figura 1379: Seções relacionadas com a governança da inovação e seções complementares (clique na figura para abrir em outra aba o mapa de conteúdo em PDF com os links para essas seções. Você pode baixar esse PDF.)
Relação com a governança corporativa
“Governança corporativa é um sistema formado por princípios, regras, estruturas e processos pelo qual as organizações são dirigidas e monitoradas, com vistas à geração de valor sustentável para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral. Esse sistema baliza a atuação dos agentes de governança e demais indivíduos de uma organização na busca pelo equilíbrio entre os interesses de todas as partes, contribuindo positivamente para a sociedade e para o meio ambiente” (IBGC, 2023).
A próxima figura mostra uma estrutura organizacional genérica da governança corporativa para localizar:
Utilizamos o termo “alta direção” em conformidade com a norma ISO 9000:2015, para designar o grupo de pessoas responsável por dirigir e controlar a organização no mais alto nível (como CEO e diretores). Este grupo é denominado como “executive management” na literatura internacional. |
Figura 1336: esquema representativo genérico da hierarquia de uma governança corporativa
Fonte: adaptado de (IBGC, 2023)
A descrição detalhada dessa figura está na seção “Governança corporativa”. |
A governança corporativa garante o direcionamento e o controle global da organização. As decisões e estruturas que envolvem a inovação devem, portanto, estar alinhadas com os princípios e responsabilidades da governança corporativa tradicional.
A governança corporativa estabelece os mecanismos de supervisão e direcionamento estratégico da organização. A governança da inovação se insere nesse sistema como uma camada específica, relacionada principalmente às decisões sobre estratégia, risco e direcionamento da inovação — o que será detalhado nos tópicos seguintes.
A governança da inovação como desdobramento da governança corporativa
A inovação deve ser tratada como parte integrante do sistema de governança corporativa. Isso significa que o conselho de administração precisa ter ciência da forma como a empresa governa a inovação — mesmo que não intervenha diretamente.
Em muitas organizações, a responsabilidade pela inovação recai sobre a gestão executiva, mas o conselho deve supervisionar, legitimar e garantir a coerência entre os objetivos de inovação e os demais objetivos estratégicos da empresa.
A forma como a governança da inovação se desdobra a partir da governança corporativa depende também da estrutura organizacional adotada. Quando a inovação é tratada como função estratégica, sua governança tende a ser coordenada diretamente pela alta direção, com suporte de fóruns e comitês que garantem alinhamento. Em estruturas mais distribuídas, redes de campeões ou lideranças locais podem assumir parte da responsabilidade, exigindo mecanismos mais robustos de coordenação e supervisão.
Além disso, é papel da governança corporativa avaliar se os mecanismos de governança da inovação estão operando de maneira eficaz, respeitando os princípios de transparência, prestação de contas e alinhamento com os interesses dos stakeholders. Em outras palavras, a governança da inovação é um desdobramento da governança corporativa, com foco específico na capacidade de inovar de forma coordenada e sustentável.
A governança da inovação não substitui a governança corporativa — ela a complementa e dela deriva.
A próxima figura ilustra de maneira conceitual que a governança da inovação tem autonomia operacional e identidade própria, mas sua legitimidade e mandato derivam da governança corporativa. Isso está refletido corretamente ao manter a governança da inovação como uma entidade identificável, mas internalizada no arcabouço maior da governança corporativa.
Figura 1376: ilustração conceitual da governança da inovação como uma entidade identificável, mas internalizada no arcabouço maior da governança corporativa.
As atribuições do conselho na governança da inovação
As atribuições do conselho de administração na governança da inovação não consistem em gerir iniciativas diretamente, mas em assegurar que a inovação receba direcionamento estratégico, supervisão legítima e apoio institucional — em consonância com os princípios da boa governança.
As principais atribuições do conselho em relação à governança da inovação incluem:
- Aprovar ou revisar a estratégia de inovação: O conselho deve avaliar se a estratégia de inovação proposta está alinhada aos objetivos corporativos e ao perfil de risco da organização.
- Definir parâmetros de risco aceitáveis: É responsabilidade do conselho estabelecer, em conjunto com a alta direção da governança da inovação, o grau de tolerância ao risco em projetos de inovação.
- Avaliar a performance em inovação: Por meio de auditorias e indicadores, o conselho deve monitorar os resultados e a efetividade da inovação.
- Nomear e avaliar a alta direção com base também em critérios ligados à inovação: A governança da inovação inclui o acompanhamento do comprometimento dos executivos com a agenda inovadora.
- Garantir a coerência organizacional: O conselho deve assegurar que os mecanismos de governança da inovação promovam colaboração e evitem a fragmentação por áreas funcionais.
Além dessas atribuições, cinco domínios específicos da governança corporativa exercem influência direta sobre a inovação:
- Revisão da estratégia: assegurar que a inovação esteja incorporada à estratégia de longo prazo.
- Gestão de riscos: estabelecer a tolerância ao risco associada a inovações mais radicais e disruptivas.
- Auditoria e conformidade: solicitar indicadores claros de desempenho em inovação e acompanhar sua evolução.
- Avaliação de performance: incluir critérios de inovação nas avaliações da alta direção. Ou seja, incorporar aspectos de inovação nos indicadores que resultam em bonificações.
- Nomeação de lideranças: selecionar e desenvolver líderes comprometidos com a agenda de inovação.
Além disso, o conselho deve estar atento a possíveis paradoxos. A necessidade de mitigar riscos pode, em alguns casos, levar a decisões excessivamente conservadoras, limitando o potencial de inovações mais radicais. Cabe ao conselho equilibrar essas tensões, garantindo que a inovação seja tratada como um ativo estratégico de longo prazo, e não apenas como uma agenda pontual.
Esse envolvimento do conselho tende a ser mais direto em empresas que operam em setores intensivos em inovação ou em estágios de transformação estratégica, e mais indireto em organizações com modelos de inovação já consolidados. A maturidade organizacional, portanto, influencia o grau de formalização e o papel esperado do conselho nesse processo.
Na prática, a governança da inovação opera como um desdobramento vertical da governança corporativa. Ela conecta o conselho de administração, a alta direção e os responsáveis operacionais pela inovação, assegurando alinhamento estratégico, coerência institucional e fluidez na tomada de decisão.
O nível de detalhamento e formalidade dessas atribuições deve ser compatível com o porte da empresa, sua maturidade em inovação e o papel que a inovação desempenha em sua estratégia de crescimento ou transformação.
Não esqueça, no entanto, da discussão sobre “como evitar o engessamento”, apresentada na seção principal sobre governança da inovação. |
Papéis e responsabilidades da alta direção
A alta direção (executive management) compreende a cúpula executiva da organização — normalmente o CEO e os seus diretores estatutários (C-levels). No contexto da governança da inovação, sua responsabilidade vai além da execução: trata-se de estruturar um sistema organizacional coerente que alinhe estratégia, processos, recursos e comportamentos voltados à inovação.
Lideranças intermediárias e funcionais, embora não façam parte da alta direção, podem ter papel relevante nos comitês de inovação, que atuam como estruturas de assessoramento estratégico ao conselho e de articulação com a diretoria. Esses comitês analisam megatendências, propõem diretrizes para o portfólio e apoiam a conexão entre diferentes níveis organizacionais — mas a responsabilidade final pela governança da inovação permanece com a alta direção, conforme previsto por Deschamps & Nelson (2014). |
Diferentemente do conselho de administração, que atua no nível institucional e supervisiona, a alta direção concebe e operacionaliza os mecanismos internos da governança da inovação. Isso exige tanto visão estratégica quanto ação concreta para promover cultura, alocar investimentos e estabelecer mecanismos de coordenação.
Princípios da governança da inovação relacionados com a alta direção
Responsabilidade pela estruturação do sistema: A governança da inovação exige um sistema holístico, originado na cúpula executiva, que alinhe metas, políticas, recursos, papéis e autoridade decisória. Não se trata de somar iniciativas isoladas, mas de criar uma arquitetura coerente e integrada.
É papel da alta direção definir como a inovação cria valor, como será capturada e como será organizada internamente para isso.
Promoção de valores e comportamentos: A liderança deve estabelecer, por meio do exemplo, os comportamentos esperados para a inovação: abertura ao risco, colaboração, ambição tecnológica e foco em impacto. A coerência entre discurso e prática é essencial para legitimar o sistema.
Decisões estruturantes sob responsabilidade da alta direção
As decisões estruturantes sob responsabilidade da alta direção moldam o sistema de governança da inovação e devem ser continuamente revisitadas à medida que a empresa evolui. Essas decisões traduzem os direcionamentos estratégicos do conselho em um sistema de governança executável, com coerência organizacional e viabilidade operacional. Isso inclui:
- Explicar a visão e a missão da inovação estabelecidas pela liderança corporativa, traduzindo seus princípios em orientações práticas e ações coordenadas.
- Definir a lógica de criação de valor esperada da inovação (ex.: crescimento, diferenciação, impacto social).
- Escolher e estruturar o modelo de governança, alocando responsabilidades primárias e de apoio.
- Priorizar e alocar recursos com base em um plano estratégico de inovação.
- Monitorar o desempenho e resolver conflitos internos, garantindo alinhamento entre funções, unidades e níveis hierárquicos.
Esses princípios e decisões estruturantes da governança da inovação podem ser documentadas em um Mandato da Inovação. |
Integração com cultura e processos
A integração entre o sistema de governança da inovação, a cultura organizacional e os processos não é automática nem imediata. A cultura, em especial, não é um elemento que se define por decreto, mas uma consequência acumulada de práticas recorrentes, decisões simbólicas e coerência institucional, relacionadas com as outras dimensões da arquitetura organizacional. A imposição de estruturas formais, por mais bem desenhadas, tende ao fracasso quando confronta valores e hábitos enraizados.
Na prática, essa integração ocorre por meio de alinhamentos progressivos entre o que é proposto pela alta direção e o que é vivido pelas equipes — um movimento que exige sensibilidade organizacional e tempo. O sistema de governança deve, portanto, dialogar com os processos já existentes, respeitando sua lógica e inserindo critérios, fóruns e responsabilidades sem gerar rupturas desnecessárias.
Além disso, a cultura organizacional está fortemente conectada à estrutura, aos processos, ao clima, aos incentivos e à liderança, como representado na figura abaixo que sintetiza as dimensões da arquitetura organizacional.
Figura 1213: elementos da arquitetura organizacional suas inter-relações e a estratégia
Adaptado de: Galbraith, J. R. (2014)
Uma descrição mais detalhada da figura apresentada pode ser consultada na seção da flexM4i sobre Arquitetura organizacional. |
Assim, qualquer mudança efetiva na governança da inovação deve considerar esse ecossistema interno e buscar coerência sistêmica entre os diferentes elementos que moldam o comportamento organizacional.
Não se trata de adaptar a cultura à governança, nem de simplesmente adaptar a governança à cultura, mas de promover um processo recíproco de transformação, no qual a prática da inovação — sustentada por processos revisados e escolhas estratégicas da alta direção — contribui para a evolução cultural da organização.
Condições
A alta direção deve viabilizar a inovação no cotidiano organizacional, assegurando as condições para que ela ocorra com consistência e alinhamento estratégico, como:
- Validar a execução da estratégia de inovação e acompanhar seu alinhamento contínuo com os objetivos corporativos.
- Estabelecer diretrizes e aprovar orçamentos para o portfólio de inovação, inclusive prevendo recursos para iniciativas exploratórias (como H3), mesmo sem projetos definidos no momento.
- Apoiar a criação e o funcionamento de comitês, fóruns e rituais de governança que assegurem coordenação entre as áreas.
- Prestar contas ao conselho sobre resultados, aprendizados e riscos relacionados à inovação.
A mobilização direta de equipes, a estruturação detalhada do portfólio e a proposição de novos projetos podem ser atribuídas a estruturas de apoio como os comitês de inovação, que operam sob supervisão da alta direção.
Modelos de governança da inovação
Um dos componentes estruturantes da governança da inovação é o modelo de governança adotado — isto é, a forma como responsabilidades e autoridade são alocadas para conduzir a inovação em nível organizacional. Esses modelos envolvem princípios, mecanismos e decisões que asseguram coerência, legitimidade e efetividade nos esforços inovadores da organização.
Ainda que muitas empresas não utilizem formalmente o termo “modelo de governança da inovação”, quase todas operam sob alguma configuração — explícita ou implícita — que define quem lidera, como as decisões são tomadas e como os esforços são coordenados. Essa configuração pode assumir diferentes formas, refletindo a estrutura, a cultura, a maturidade e os objetivos estratégicos da organização.
Portanto, os modelos de governança da inovação representam arranjos organizacionais específicos que dão forma à distribuição de papéis e ao exercício do poder decisório em relação à inovação. Eles não são sinônimos da governança como um todo, mas sim um dos seus elementos mais visíveis e determinantes.
Relação com o design organizacional A definição e a implementação de modelos de governança da inovação são, na prática, decisões de design organizacional. Ao escolher quem exerce a autoridade, como as decisões são tomadas, quais mecanismos de coordenação são instituídos e como as responsabilidades se distribuem entre funções e níveis hierárquicos, a organização está especificando parte da sua arquitetura voltada à inovação. Esses modelos refletem escolhas sobre estrutura, papéis e processos — elementos centrais do design organizacional. |
A seguir, apresentam-se os principais tipos de modelos, critérios para sua escolha e combinação, variações práticas e dados sobre sua aplicação em empresas multinacionais.
Tipologia dos modelos de governança
A pesquisa de Deschamps & Nelson (2014) identificou nove modelos principais de governança da inovação, classificados com base em dois critérios:
- Número de responsáveis primários: individual, dupla ou grupo;
- Nível hierárquico da liderança: alta direção , gerência sênior ou média gestão.
Os modelos podem ser utilizados isoladamente ou em combinação, como modelo primário (estratégico) e modelos de apoio (operacionais e táticos). A seguir, apresenta-se a tipologia principal:
- Time de alta direção como grupo colegiado: Responsabilidade compartilhada entre os principais executivos (CEO, CTO, CFO, heads de unidades etc.). Modelo mais frequente entre grandes empresas.
- CEO ou presidente de divisão como líder principal: Liderança centralizada que sinaliza prioridade estratégica à inovação.
- Comitê diretivo de alto nível: Grupo multifuncional, liderado por um executivo sênior (geralmente CTO ou CIO), com foco em coordenação transversal.
- CTO ou CRO como campeão da inovação: Mais comum em empresas de base tecnológica. Foco técnico e forte domínio de conteúdo.
- Chief Innovation Officer (CIO) ou gerente de inovação dedicado: Responsável exclusivo pela coordenação das práticas de inovação, sem acumular funções operacionais.
- Rede de campeões da inovação: Grupo de profissionais com protagonismo informal ou estruturado na difusão de práticas e cultura de inovação.
- Modelo em dupla (duo): Combinação de dois líderes com papéis complementares (por exemplo, CTO e líder de negócios).
- Modelo coletivo entre pares: Responsabilidade distribuída em grupo colegiado sem hierarquia clara. Mais viável em estruturas colaborativas.
- Nenhum modelo definido: Situação emergente ou reflexo de uma cultura organizacional informal. Gera alto risco de desalinhamento.
A escolha do modelo de governança impacta diretamente a efetividade da inovação. Essa decisão não deve ser tomada de forma intuitiva ou apenas por conveniência, mas com base em critérios que reflitam a realidade organizacional e os desafios estratégicos enfrentados, apresentados no próximo tópico.
Critérios para escolha e combinação de modelos
A definição do modelo de governança da inovação deve considerar tanto as características organizacionais (critérios) quanto os perfis e estilos das lideranças (critérios ligados à liderança). Esses critérios orientam a escolha entre centralização e descentralização, entre estruturas formais ou mais distribuídas, e entre diferentes níveis de alocação de autoridade. Trata-se de uma decisão estratégica, com impacto direto na efetividade da governança e na capacidade da organização de sustentar seus esforços inovadores ao longo do tempo.
Critérios organizacionais
- Estrutura organizacional e grau de centralização: Empresas com portfólio mais homogêneo ou operações concentradas tendem a adotar modelos mais centralizados. Já grupos empresariais com forte autonomia regional ou múltiplas unidades de negócio costumam implementar arranjos descentralizados ou híbridos.
- Cultura organizacional: Modelos de governança devem ser compatíveis com a cultura vigente. Organizações com culturas hierárquicas e orientadas ao controle demandam estruturas claras e verticais. Já culturas colaborativas e orientadas à aprendizagem tendem a favorecer redes, fóruns e comitês interfuncionais.
- Grau de maturidade da inovação: Empresas que já consolidaram processos de inovação podem ampliar o escopo e diversificar os mecanismos de governança. Organizações em estágio inicial precisam de modelos mais focados, com poucos interlocutores e forte apoio da liderança.
- Abrangência do portfólio e tipos de inovação: Modelos de negócio inovadores, iniciativas de digitalização, sustentabilidade e práticas de inovação aberta requerem maior articulação entre áreas. Isso pode demandar estruturas transversais mais robustas, comitês dedicados ou fóruns de integração.
- Estágio estratégico e transições organizacionais: Momentos de mudança estratégica, sucessão de liderança ou reestruturação corporativa são propícios para revisar o modelo de governança. No entanto, alterações frequentes e não planejadas tendem a comprometer a estabilidade e a legitimidade do sistema.
Critérios ligados à liderança
- Presença de lideranças estratégicas: A existência de líderes com perfil inovador — como um CEO com visão transformadora ou um CTO com protagonismo organizacional — influencia o modelo adotado. Em muitos casos, o estilo e a convicção desses líderes moldam a arquitetura da governança.
- Estilo gerencial predominante: Empresas orientadas à participação tendem a adotar modelos colegiados ou baseados em redes de campeões. Já organizações com estilo mais diretivo centralizam a governança em figuras específicas, como o Chief Innovation Officer ou o próprio CEO.
Relação com o clima organizacional e os estilos de liderança A escolha e a efetividade dos modelos de governança da inovação também são influenciadas pela maneira como a liderança é exercida e percebida na organização. Como discutido na seção sobre clima organizacional e estilos de liderança da flexM4i, diferentes estilos — como o maestro, o produtor, o líder integrador ou o gerente controlador — afetam diretamente o ambiente de inovação, a fluidez dos processos e a legitimidade das decisões. Governanças implantadas em contextos com estilos mais fechados, avessos ao risco ou com baixa escuta ativa tendem a centralizar decisões e engessar a inovação. Em contraste, ambientes com liderança integradora, orientada à colaboração e à experimentação, favorecem modelos mais distribuídos, como comitês transversais ou redes de campeões. |
Combinações e variações de modelos
Empresas inovadoras raramente se apoiam em um único modelo de governança. A prática mostra que, à medida que a inovação se consolida como responsabilidade transversal, diferentes mecanismos precisam ser ativados em vários níveis organizacionais, com funções complementares.
A pesquisa de Deschamps & Nelson (2014) indica que muitas empresas adotam modelos primários — como o CEO, um comitê diretivo ou o CTO — combinados com modelos de apoio voltados à operacionalização, coordenação local ou disseminação de práticas. Esses arranjos visam tanto à legitimidade estratégica quanto à capilaridade cultural.
Combinações comuns:
- Liderança formal + suporte técnico e cultural: o CEO pode ser o principal responsável pela inovação, mas apoiado por um Chief Innovation Officer (CIO), uma rede de campeões e fóruns transversais.
- Estrutura central + replicação local: CTOs corporativos podem liderar em nível global, enquanto CTOs ou gerentes de inovação atuam de forma alinhada nas divisões ou unidades de negócio.
- Modelo colegiado + mecanismos bottom-up: comitês diretivos ou boards de inovação podem ser acompanhados por plataformas digitais, facilitadores ou objetivos individuais de inovação.
Variações ao longo do tempo
A combinação de modelos não é estática. Empresas adaptam seus mecanismos em resposta a:
- Ampliação do escopo da inovação (ex: inclusão de modelos de negócio, sustentabilidade, transformação digital etc.)
- Mudanças estratégicas ou de liderança
- Aprendizados com a implementação de mecanismos anteriores
Recomendações:
- Tornar explícita a arquitetura de governança adotada, com papéis bem definidos entre os modelos primário e de apoio.
- Revisar periodicamente essa estrutura, principalmente em momentos de transição estratégica ou reestruturação organizacional.
- Garantir coerência entre os modelos adotados e o estágio de maturidade da inovação na empresa, evitando sobreposições ou lacunas de responsabilização.
Modelos combinados na prática: o caso Solvay A maioria das empresas inovadoras não adota um único modelo de governança da inovação. Em vez disso, articula mecanismos formais e informais, distribuídos entre diferentes níveis organizacionais, com funções complementares. A Solvay oferece um exemplo claro de combinação sofisticada:
Esse arranjo permite à empresa orquestrar inovações incrementais e radicais simultaneamente, promovendo alinhamento, coerência e capilaridade cultural. A lógica da Solvay ilustra como modelos primários (estratégicos) e modelos de apoio (operacionais e culturais) podem ser combinados de forma consistente, reforçando a efetividade da governança, permitindo a adaptação ao contexto organizacional em constante mudança. Este caso foi extraído de Deschamps & Nelson (2014) |
Efetividade percebida dos modelos de governança
A adoção de um modelo de governança da inovação não garante, por si só, sua efetividade. Na prática, muitos modelos são implantados de forma parcial, mal adaptados ao contexto organizacional ou centrados em estruturas legadas que dificultam a renovação dos mecanismos decisórios.
Nesse sentido, Smith et al. (2024) acrescentam uma crítica relevante:
Os modelos tradicionais de governança, frequentemente baseados em lideranças ou comitês centralizados, tendem a reproduzir racionalidades institucionais antigas e carecem de mecanismos reflexivos contínuos.
Segundo Smith et al. (2024), é necessário ir além da governança orientada exclusivamente à entrega de projetos — propondo um sistema que permita revisitar criticamente os próprios fundamentos da inovação. Essa visão reforça a governança da inovação como instrumento institucional dinâmico, com potencial para catalisar novas formas de articulação entre ciência, tecnologia e sociedade.
Filatotchev et al. (2020) argumentam que modelos eficazes de governança da inovação devem ser capazes de equilibrar controle com flexibilidade e aprendizado por meio da integração da:
- abordagens baseadas na teoria da agência — que priorizam o controle e a mitigação de riscos e
- aquelas fundamentadas na visão baseada em recursos, que buscam coordenar competências, redes e conhecimentos distribuídos.
Em uma pesquisa realizada com 113 empresas multinacionais, Deschamps & Nelson (2014) identificaram diferentes níveis de satisfação com os modelos utilizados:
- 13% estão muito satisfeitas com sua governança da inovação.
- 44% estão relativamente satisfeitas, mas reconhecem lacunas a endereçar.
- 38% estão insatisfeitas, principalmente por falhas de coordenação ou indefinições de responsabilidade.
- 5% estão muito insatisfeitas, considerando a necessidade de um redesenho completo do sistema.
Essa distribuição sugere que a maioria das empresas ainda enfrenta desafios relevantes para consolidar práticas eficazes e sustentáveis de governança da inovação.
Modelos mais bem avaliados
Os modelos que concentram a responsabilidade em:
- Comitês diretivos de alto nível (multifuncionais, com visibilidade e autoridade), ou
- CTOs/CROs com forte atuação estratégica e técnica,
foram os que apresentaram os maiores índices de satisfação entre os respondentes.
Esses modelos parecem favorecer o alinhamento entre decisões estratégicas e execução técnica, além de garantir legitimidade interna.
Principais causas de insatisfação
Entre os fatores mais mencionados pelas empresas insatisfeitas estão:
- Falta de formalização e aderência ao processo de inovação.
- Baixa orientação ao cliente ou ao mercado.
- Manutenção de estruturas verticais e funcionais, com silos operacionais.
- Inconsistências na priorização de projetos e recursos.
- Ambiguidade ou mudança frequente nas responsabilidades atribuídas.
Causas estruturais da baixa efetividade
Mesmo entre empresas com modelos definidos, a baixa efetividade é frequentemente explicada por problemas de engajamento da alta liderança. As causas mais recorrentes incluem:
- Falta de tempo, prioridade ou clareza da alta direção quanto à inovação.
- Delegação sem empoderamento real aos responsáveis diretos.
- Desalinhamento entre discurso e prática — especialmente em relação ao risco, cultura e objetivos.
Lições para a prática
A governança da inovação exige mais do que uma estrutura formal: requer comprometimento pessoal, coerência de prioridades e capacidade de adaptação.
Os modelos de governança da inovação não são fórmulas prontas, mas arranjos organizacionais contingentes, que devem ser ajustados ao contexto estratégico, à cultura vigente e ao grau de maturidade da organização. Sua efetividade depende não apenas da estrutura formal, mas do envolvimento contínuo da alta liderança e da integração com os demais elementos da arquitetura organizacional.
Modelos de governança da inovação e arquitetura organizacional
A escolha e a configuração dos modelos de governança da inovação integram o processo mais amplo de design organizacional — entendido na flexM4i como o esforço deliberado para especificar e construir a organização. O resultado desse processo é a arquitetura organizacional, composta por elementos como estrutura, processos, pessoas, incentivos, cultura e clima, conforme descrito na seção sobre Arquitetura organizacional.
Nesse sentido, os modelos de governança da inovação representam um recorte estruturante da arquitetura organizacional, pois definem quem decide, com base em quais critérios, em quais instâncias e com quais mecanismos de coordenação. A escolha desses modelos deve estar alinhada aos demais elementos da arquitetura, garantindo coerência com a cultura, o estilo de liderança, a estrutura formal e os rituais decisórios existentes.
A falta de alinhamento entre o modelo de governança e os demais elementos da arquitetura organizacional pode gerar desalinhamentos estruturais, como duplicidade de papéis, ausência de accountability, sobreposição de fóruns ou deslegitimação cultural dos mecanismos instituídos. Por isso, recomenda-se que a definição do modelo de governança seja conduzida como parte integrada do design organizacional, com atenção ao seu impacto na arquitetura como um todo.
A definição e implementação de modelos de governança da inovação não ocorrem no vazio. Elas fazem parte de um processo mais amplo de design organizacional, que na flexM4i é entendido como o caminho que conduz à arquitetura organizacional da empresa.
Arquitetura ou design organizacional? Como colocado na wikipedia em inglês, o termo “arquitetura organizacional” também é conhecido como “design organizacional”. Mas ressaltamos que o termo “design” é polissêmico e, portanto, ambíguo. Ele pode significar o “processo de design” ou o “resultado do design”. Porém na flexM4i, adotamos que o processo de “design organizacional” resulta em uma “arquitetura organizacional”, como ilustra a próxima figura.
No entanto, utilize o termo mais alinhado com a cultura de sua empresa. Você pode denominar o resultado como design organizacional. Conheça os verbetes da flexM4i sobre: |
A arquitetura organizacional é o resultado do design, articulando elementos como:
- estrutura organizacional
- pessoas e liderança
- cultura e clima organizacional
- processos e governança
- indicadores e incentivos
Esses elementos se conectam com a estratégia da organização e com suas ofertas de produtos e serviços, compondo a arquitetura empresarial como um todo.
Nesse contexto, os modelos de governança da inovação são manifestações específicas do design organizacional voltadas à agenda da inovação. Eles alocam autoridade, coordenam decisões e estabelecem mecanismos de controle e aprendizagem, devendo ser coerentes com os demais elementos da arquitetura organizacional vigente.
Ao tratarmos da governança da inovação, estamos, na prática, especificando parte da arquitetura organizacional necessária para viabilizar e sustentar a inovação
Implicações práticas
- Modelos de governança devem respeitar os valores e mecanismos já estabilizados na organização.
- A adoção de novos modelos pode demandar mudanças estruturais mais amplas, especialmente em organizações com baixa maturidade em inovação.
A governança da inovação deve ser tratada como parte do design organizacional contínuo, e não como um ajuste pontual ou isolado.
Procedimentos e apoio do chatGPT
Este tópico é comum para as cinco seções que tratam da governança da inovação.
Foi utilizada a versão mais recente do ChatGPT-4o, com funcionalidades aprimoradas de análise e geração textual.
Preparação antes da interação com o ChatGPT
Antes do início da colaboração com o ChatGPT, o autor realizou uma leitura aprofundada de referências fundamentais sobre governança da inovação e governança corporativa, com destaque para o livro Innovation Governance de Deschamps & Nelson (2014), além de artigos acadêmicos complementares como Shibao et al. (2024), Ribeiro (2009), e documentos técnicos sobre governança da inovação desenvolvidos no âmbito do Ministério da Economia. Também foram considerados conteúdos já existentes na flexM4i, especialmente as seções sobre gestão da inovação, arquitetura organizacional, tese de inovação, papéis da alta direção, e tópicos associados a ESG e sustentabilidade. A obra Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa (IBGC, 2023) também foi revisitada para reforçar a articulação entre a governança da inovação e a governança corporativa. Além disso, foi incorporado o Modelo das Duas Rodas (Faria et al., 2017) como principal referência para o tratamento da governança em pequenas e médias empresas.
Trabalho interativo com o ChatGPT
A construção das seções sobre governança da inovação ocorreu por meio de um processo iterativo distribuído ao longo de 18 horas e 27 interações entre o autor e o modelo ChatGPT, que resultou em 42 páginas com aproximadamente 12 palavras. O desenvolvimento do conteúdo seguiu uma sequência estruturada: definição autoral do sumário e dos tópicos; mapeamento dos trechos relevantes nos artigos originais; elaboração de parágrafos com base nesses trechos; e, por fim, revisão crítica e integração textual com os conteúdos já consolidados na flexM4i.
O ChatGPT atuou como parceiro analítico e redacional, auxiliando na seleção e interpretação de trechos, proposição de estruturas argumentativas, redação de parágrafos e síntese de ideias complexas. Além disso, foi utilizado para localizar citações em arquivos PDF, identificar trechos conceitualmente relevantes e revisar a coerência interna dos argumentos.
Durante o processo, foram produzidas versões preliminares e consolidadas de tópicos como: definições de governança da inovação, condições e motivos para sua adoção, relação com a governança corporativa, papéis da alta direção, indicadores, auditoria, modelos de governança, premissas para implementação, barreiras organizacionais e recomendações para PMEs. Cada tópico foi desenvolvido a partir de uma análise cruzada entre referências acadêmicas e experiências práticas discutidas com o modelo.
O modelo foi instruído a adotar uma postura crítica e analítica, sendo solicitado explicitamente a oferecer contrapontos e sugestões alternativas sempre que pertinente. Em diversas ocasiões, tensionamentos conceituais e propostas de reformulação foram gerados a partir das provocações do autor, que conduziu editorialmente todas as decisões de conteúdo. Nenhuma parte do texto foi gerada de forma automática; todas as formulações passaram por ciclos sucessivos de refinamento, revisão e validação.
Além do texto, algumas figuras conceituais foram propostas ou ajustadas com apoio do ChatGPT, e foram incluídas notas explicativas com base em modelos como o MDR, a ISO 56002 e o framework de Deschamps & Nelson. A convergência e distinção entre governança e gestão da inovação, bem como entre os mecanismos de governança e os modelos de coordenação ou orquestração, também foram exploradas conceitualmente com o apoio analítico do modelo.
A versão final dos textos foi cuidadosamente revisada pelo autor dessas seções com atenção à consistência terminológica, rigor conceitual e compatibilidade com os demais conteúdos da metodologia. Essa abordagem buscou garantir que as seções sobre governança da inovação se integrassem de forma coesa ao corpo teórico-prático da flexM4i, respeitando sua proposta metodológica e seu compromisso com a clareza e aplicabilidade.
Referências
Deschamps, J.-P., & Nelson, H. (2014). Innovation governance: How top management organizes and mobilizes for innovation. John Wiley & Sons.
Filatotchev, I., Aguilera, R. V., & Wright, M. (2020). From governance of innovation to innovations in governance. Academy of Management Perspectives, 34(2), 173–181. https://doi.org/10.5465/amp.2017.0011
Galbraith, J. R. (2014). Designing organizations: Strategy, structure, and process at the business unit and enterprise levels. John Wiley & Sons.
IBGC (2023). Código das melhores práticas de governança corporativa. 6a.edição, Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, São Paulo, SP. 80p. Disponível em: https://conhecimento.ibgc.org.br/Paginas/Publicacao.aspx?PubId=24640 Recuperado em: 30/4/2025
Smith, R. D. J., Schäfer, S., & Bernstein, M. J. (2024). Governing beyond the project: Refocusing innovation governance in emerging science and technology funding. Social Studies of Science, 54(3), 377–404. https://doi.org/10.1177/03063127231205043